O que leva uma mulher a manter-se ao lado de um homem inadequado, violento, grosso, desrespeitador é a crença de que seu grande amor pode curá-lo e a certeza de que, no fundo, ele é bom. Ela é capaz de reconhecer que o parceiro é destrutivo, porém, por um inconsciente (e eficaz) mecanismo de defesa, nega essa condição, faz vista grossa e destrutividade e age como se o fenômeno não a importunasse, na tentativa fantasiosa de se manter protegida e teoricamente amada.


Quando consciente, ou relativamente consciente, da situação, entra em cena o pensamento mágico: Ele é menos perigoso se está ao meu lado; a distância, sua agressividade se agrava, e eu não posso controlá-lo. A mulher não se dá conta de que esse expediente é ilusório, além de mantê-la refém, de um masculino doentio. Não raro, outro mecanismo de defesa típico do feminino aparece: a convicção (e, claro, a ilusão) de que o amor tudo pode. Ela pensa: “O meu amor, de cuja profundidade não duvido, é superior à agressividade, imune a ela e capaz de curar ou fazer frente a qualquer outro sentimento banal, tal como o ódio que meu parceiro pensa experimentar por mim. Ele me ama e não sabe”. Ou, então: “Meu amor promovera o amor dele, que se rendera à grandiosidade e à beleza desse sentimento, o único capaz de fazer amadurecer a infantilidade de seu ingênuo ódio”.


O que tento descrever é uma distorção que nós mulheres fazemos além de onipotência, tentamos contribuir para que se eternize a secular guerra entre os sexos. Comparado à pequenez do ódio masculino, a mulher crê que o amor feminino seja capaz de afirmar sua superiodade. Possível que, nesse antagonismo, entre em jogo uma rivalidade absurda entre os gêneros. A mulher só consegue se safar desse drama quando se alegra com a condição feminina e reconhece a potência e a beleza contidas nela. Enquanto isso não ocorre, tenta aniquilar a destrutividade do parceiro por meio do aspecto destrutivo (perverso) de seu suposto amor. E não se dá conta de que, assim, é igualmente agressiva. No fundo ele é bom, ela pensa. Ora, não é com o fundo de um homem que a mulher convive, mas com o que esta bem a superfície: o comportamento, os gestos, os dizeres, o estado de espírito. Além disso ela não tem o papel de mãe , de curadora na vida dele, e sim o de parceira amorosa.


O desejo de se colocar assimetricamente em relação ao parceiro só confirma o instintual e jurássico posicionamento superior em que ele, por ser bruto, estúpido, também se coloca. Esse casal jamais vai conhecer o amor maduro. Homem grosso, bruto, violento, tem dúvidas em relação a identidade masculina, presença precária ou ausência de referência masculina sadia na história de vida, temor e inveja do feminino e de suas capacidades, desqualificado e destrutivo com as mulheres por imaturidade psicológica. Essa dificuldades não podem tratadas somente com amor. Até podem agravar-se, requerem intervenções terapêuticas. E, em geral, não basta somente tratar o homem, necessário também uma perspectiva sistêmica, o que inclui o tratamento da mulher ou do casal. Por isso, vamos buscar o que a psicanálise pode nos desenvolver, vamos buscar as descobertas interiores dentro de nós.

* Rossana Brasil Kopf –  advogada e psicanalista e integrante do Movimento Brasil Sem Drogas

Artigo publicado no jornal O Estado e reproduzido neste site com autorização da autora

 

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