Nestes tempos de domínio total da mercadoria, impressiona o caminho do papa Francisco. Tudo começou quanto, ao chegar ao Brasil, ele declarou: “Não trago ouro nem prata, mas lhes trago o que de mais valioso me foi dado: Jesus Cristo”. Palavras contundentes para um religioso.


Ele nos dizia que somente tinha uma verdade a proclamar, somente um caminho a apontar, somente uma boa nova a publicizar: o evangelho de Jesus Cristo. Nada mais; nada menos. Francisco ia diretamente à fonte da espiritualidade ocidental: o Novo Testamento, sem se embaraçar nem nos confundir com mil outros ensinamentos religiosos, éticos ou morais secundários ou supérfluos mesmo. Indicava o caminho que supera a todos os caminhos: “Ainda que eu falasse línguas, as dos homens e as dos anjos, se eu não tivesse a caridade, seria como um bronze que soa como um címbalo que tine… Agora, permanecem a fé, esperança, caridade, essas três coisas. A maior delas, porém, é a caridade”. Mas o que é a caridade?


O papa Francisco responde por um termo que eu nunca tinha visto empregado nesse sentido: a proximidade. Sim, a proximidade ao outro, essa atitude seria a plenitude não somente do cristianismo, dos que têm fé em Deus, mas de todo homem e toda mulher que vivem ética e moralmente.


Aliás, o evangelho é a fonte de toda a espiritualidade, religiosa ou não, do Ocidente e até do Oriente. Proximidade que outros traduzem por presença ao outro, solidariedade, e os budistas por compaixão.


A proximidade como oposto de egoísmo e narcisismo e que pode expressar a ética de qualquer função e profissão, como o político ser próximo de seu eleitor que ele representa o médico ser próximo de seu paciente e assim por diante. Não são o ouro, a prata, o dinheiro, o saber que fazem a grandeza da humanidade, mas a proximidade.


Para muitos, modernizar a Igreja Católica significa aceitar o casamento dos padres ou a ordenação de mulheres. Temas importantes, mas que não passam de penduricalhos ao lado da verdadeira revolução que seria uma volta da Igreja à proximidade. Eis a atitude e o discurso de Francisco. “Não se cansem de trabalhar por um mundo mais justo e solidário! Ninguém pode permanecer insensível às desigualdades que existem no mundo”.


Assim é a verdadeira revolução. “Você pode ter sido criado na igreja, pode ter sido batizado na igreja, pode ter servido na igreja, pode ser que tenha casado na igreja e ainda assim acordar no inferno caso você esteja meramente na igreja e não em Cristo”. Que são os rituais sem a vivência do Evangelho? Címbalos que fazem zoada.


Esta semana Francisco acrescentou: “Cada pessoa deve seguir o bem e combater o mal segundo concebe”. Assim o papa torna-se universal já que todas as religiões, todas as éticas e todos os códigos de honra apontam na direção da proximidade. Aqui sábios, santos, crentes e ateus se reencontram; religiosidade e espiritualidade convergem: o amor abre, liberta, faz viver. Eis o caminho revolucionário de Francisco em tempos de individualismo e consumo idolatrado.

André Haguette é sociólogo – haguette@ superig.com.br


Artigo publicado no jornal O Povo no dia 6 de outubro de 2013 e reproduzido neste site com autorização do autor

 

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