Ser livre é a maior fortuna do ser humano. Não há nada que compre e que pague a maravilha de ser seu único e intransferível proprietário. E quando eu digo livre, não falo dessas loucuras que se vê por aí, de correr pelado na rua, mandar o chefe pro inferno, a sogra pastar. Nada disso. Aliás, a liberdade não deveria ser entendida dessa forma tão rasa. Vejo como as pessoas esbravejam, levantam bandeiras, abaixam as calças. Querem mostrar uma independência e autonomia para o mundo, enquanto, no fundo, são escravas dos seus próprios medos e incertezas. Alguém deve ir lá e dizer a elas que cuspir ofensas na cara dos outros não faz de ninguém um ser livre. Quem faz isso é chato, presunçoso, qualquer outra coisa. Por favor, não confundam liberdade de expressão com oferta gratuita de hostilidade.


Um homem livre é aquele que não se submete à prisão de nenhum tipo, muito menos àquelas impostas por outros, até porque ser prisioneiro seria um tremendo sacrilégio contra a sua própria natureza. Ele é livre porque pensa por si só, porque faz as suas escolhas e assume os seus riscos. E pronto. A liberdade é muito, mas muito maior do que um topless na praia e esse discurso pobre de cidadão livre na ponta da língua. Ela é sim, íntegra, quando está embutida dentro de cada um, na capacidade de se desfazer dos preconceitos preestabelecidos e mandar embora todo o medo da rejeição, junto com a sofrida necessidade de ser aceito. A liberdade enxerga os rótulos como absolutamente ridículos, destruindo protótipos e modelos de como ser e agir de acordo com as expectativas alheias. Decerto que algumas vezes acabamos por nos afastar de nós mesmos nos percalços da vida. Por revolta, frustração, ódio ou rancor, e sem dar-nos conta, nos perdemos do que um dia fomos.


Vamos parar longe, sei lá onde, sei lá por quê. Seguimos um fluxo como ovelhas no meio do rebanho sem muito critério de direção, até que um dia a gente olha para trás e diz: “Caramba! Como que eu vim parar aqui? Que saudade do que eu fui um dia…” E talvez ainda seja. Porque liberdade é isso também. Ela é imensurável. Sempre há tempo para partir e voltar mais tarde, ir de novo, explorar, trocar. Por isso tem gente que não cabe em uma casa, que o escritório pinica e a rotina sufoca. Essas pessoas voam e voam pra bem longe, gorjeiam, seguem o rumo do vento.


Por obra da sorte ou do destino, um dia pode ser que elas voltem, como aves que reencontram o ninho depois de várias estações. Não se sabe se elas ficarão ali pousadas por muito tempo, porque quem tem alma de pássaro não se aquieta em terra firme. Ser livre para sentir. Sim! Sentir sem medo de ser tachado de boboca sentimentalista e chorar — por que não? — abrindo as torneiras que estiveram entupidas tanto tempo. Nocivo é não se emocionar com um livro, um filme de amor, uma canção que fale de saudade. Sejamos livres para abraçar longamente, sair distribuindo beijos aos amigos, vizinhos, parentes, como forma sincera e singela de gratidão e apreço.

 * Rossana Brasil Kopfe é advogada, psicanalista e integrante do Movimento Brasil Sem Drogas

 
Artigo publicado no jornal O Estado e reproduzido neste site com autorização da autora

 

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