A Igreja do Brasil produziu e ofertou incontáveis dons e talentos à Igreja Universal no século vinte, na sua enorme floresta, representada pelas comunidades dos que professam sua fé, mesmo diante dos desafios, dores e angústias, ao mesmo tempo em que carregou a marca dos sonhos, utopias e da esperança. Sem dúvida a maior dádiva do céu dentro desse contexto foi Dom Helder Câmara, pelos seus escritos: livros, poesia e pensamentos; sua capacidade criar e realizar; mas, sobretudo, sua profunda comunhão com Deus, ao afirmar: “Que eu aprenda afinal, com a paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, a cobrir de véus o acidental e efêmero, deixando em primeiro plano, apenas o mistério da Redenção”.


 


Apesar de não convivido com Dom Helder, ao ingressar no seminário em 1974, comecei a admirá-lo. Tive a sorte de ficar com ele em três ocasiões. Sua vida foi um verdadeiro hino de louvor a Deus. Em 1948 como padre novo no Rio de Janeiro se expressou de modo muito profundo e em tom poético: “Se eu pudesse sairia povoando de sono e de sonhos as noites mal dormidas dos desesperados”.


 


Sua participação no Concílio Vaticano II (1962-1965) foi excepcional, agindo nos bastidores com um articulador da melhor qualidade. Certa vez Dom Hélder confidenciou: “Uma de minhas maiores emoções, em toda minha vida, foi quando da abertura da primeira sessão do Concílio Vaticano II”. Em sua aula inaugural, o Papa João XXIII disse com força: “Aqui estamos para a nossa conversão” e ele mesmo se incluía. Isso significava que nós, cristãos, padres e bispos e até o Papa, precisávamos voltar às origens do cristianismo e a reaprender o Evangelho. A beber novamente da fonte d’água da vida que é o próprio Deus. Como místico, tornou-se conhecido no Brasil e no mundo inteiro, por sua luta em favor de uma humanidade livre, especialmente, os desafortunados da vida, os empobrecidos, os “sem voz e sem vez”, como ele costumava dizer.


 


Dom Helder foi indicado, segundo o que escutamos, quatro vezes para o Prêmio Nobel da Paz. Infelizmente as forças contrárias foram mais fortes, orquestrada pelo governo brasileiro, impediram-no de ser agraciado com o refido Prêmio.


 


Grande milagre de Dom Helder foi perceber o rosto de Deus nos irmãos, ao afirmar: “Percebi nos rostos gastos pela fome e esmagados pelas humilhações o rosto do Cristo Ressuscitado”. Quando tomou posse na Arquidiocese de Olinda e Recife, em abril de 1964, assim se expressou “Quem estiver sofrendo, no corpo ou na alma; quem, pobre ou rico estiver desesperado, terá lugar no coração do bispo”. Em vida ele tornou visível o rosto do Deus altíssimo, terníssimo e boníssimo.


 


Neste momento em que se inicia o processo de sua beatificação, saibamos olhá-lo, na sua espiritualidade genuína e cristalina, quando sua oração ao Deus altíssimo se transforma em ação e poesia: “Fomos nós, as tuas criaturas que inventamos teu nome!? O nome não é, não deve ser um rótulo colado sobre as pessoas e sobre as coisas… O nome vem de dentro das coisas e pessoas, e não deve ser falso… Tem que exprimir o mais íntimo do íntimo, a própria razão de ser e existir da coisa ou da pessoa nomeada… Teu nome é e só podia ser amor”.


 


*Escritor, blogueiro, colunista, vice-presidente da Previdência Sacerdotal e Pároco de Santo Afonso, Parquelândia, Fortaleza-CE – geovanesaraiva@gmail.com


 


 


 

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