No último fim de semana de agosto, uma delegação de cerca de 80 cearenses, estivemos em Brasília, para a I Conferência Nacional de Segurança Pública. Delegações de todos os estados da Federação, compostas de gestores, trabalhadores da segurança pública e militantes da sociedade civil – a organizada e a nem tanto -, reunidas num amplo espaço de convivência, durante quatro dias de intensas atividades e calorosas discussões, que envolveram agressões físicas, voz de prisão de oficiais a subalternos, articulações corporativistas, disputas ideológicas veementes, mas também um profundo esforço coletivo, sustentado por um duro e pragmático regimento interno, para alcançar um resultado inédito: uma espécie de carta propositiva contendo os 10 princípios e 40 diretrizes que devem balizar a Política Nacional de Segurança Pública.


Na abertura, Lula destacou esta I Conseg e a I Conferência Nacional de Comunicação ainda por se realizar como joias da coroa das conferências nacionais. E de fato: “nunca antes na história desse país…“ foi verdadeira como nunca. Para a maioria imensa ali presente, o grande desafio, além mesmo do fato de estarem face a face, polícia e vítimas de violência policial, oficiais e praças, pastoral carcerária e agentes penitenciários, só para dar alguns exemplos, na mesma mesa de discussão, a novidade por excelência foi pensar um projeto de segurança para o país, para além dos interesses particulares e localizados, por mais legítimos que eles fossem.


O resultado expressa de modo claro os limites e alcances desse propósito original. Considerando os temas-chave da disputa nesse longo processo de preparação e realização da conferência – o novo modelo de polícia a criação de uma polícia penal e o fortalecimento das Defensorias Públicas, a democratização da gestão dos Conselhos de Segurança Pública e do Conasp, a concepção da segurança pública como direito universal pautada na defesa dos direitos humanos sem restrições e com proteção especial aos mais vulneráveis e historicamente marginalizados, o reconhecimento das desigualdades sócio-econômicas como causas co-determinantes da violência e da criminalidade, e a necessidade de integração sistêmica com as políticas sociais em sentido amplo para enfrentá-las, a inserção da perspectiva da prevenção social do crime como um aspecto decisivo da segurança, a consolidação e fortalecimento do Sistema Único de Segurança Pública – há consensos quase nítidos, contradições abertas, e mesmo bizarrices no relatório final.


Um argumento preferido da dissonância crítica é o que afirma que o governo apenas busca legitimar decisões que já tomou. Não foi bem o que se viu por lá, mas vá lá que assim seja. Estamos todos, queiramos ou não, aí implicados e as decisões afetam a todos. Conhecendo as prioridades e tendências legitimadas que nortearão o debate e a construção das políticas públicas nessa área é cada um tomar o seu lugar, reaprendendo a agir e pensar tendo a nação como horizonte e dificílima prática de convivência cidadã como guia. Ou aguardar as guerras urbanas, que já batem à porta.


* Artigo publicado em 09.09.2009 no jornal O Povo e reproduzido neste site com autorização da autora.

 




Sandra Helena de Souza

– Professora de Filosofia e Ética da Unifor

sandraelena@uol.com.br

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here