Autor de mais de dez livros, com pós-doutorado em Educação, o jornalista Edvaldo Pereira Lima estará em Fortaleza para ministrar o  Workshop sobre Narrativas Biográficas, nos dias 22 e 23 de abril de 2017.  O escritor é referência em pesquisa e ensino de jornalismo literário



Foto: Reprodução / Internet


Autor de mais de dez livros, com pós-doutorado em Educação, o jornalista Edvaldo Pereira Lima estará em Fortaleza para ministrar o  Workshop sobre Narrativas Biográficas, nos dias 22 e 23 de abril de 2017.  O escritor é referência em pesquisa e ensino de jornalismo literário.


O evento abordará: o storytelling e sua matriz inspiradora para todas as formas de comunicação focadas em pessoas; a Jornada do Herói para escritores de vidas; o legado da rica tradição do Jornalismo Literário; uma ajuda instrumental do método Escrita Total@ de redação espontânea; as possibilidades de vanguarda do Jornalismo Literário Avançado; e uma contribuição de honra com as narrativas de transformação.


Diretor do curso de pós-graduação em Jornalismo Literário, Edvaldo Pereira Lima conversou com a Agência da Boa Notícia (ABN) sobre os desafios da profissão, o conceito de jornalismo literário, comunicação de massa e a postura do profissional da comunicação.  Acompanhe:

(Agência da Boa Notícia) O senhor acredita ser possível produzir jornalismo literário no cotidiano das redações jornalísticas de hoje? Como isso poderia ser feito?

Edvaldo Pereira Lima –
Sim e tem sido feito, em alguns casos exemplares, no exterior. Para que isso seja possível, a primeira coisa necessária é que editores, repórteres e autores se familiarizem de fato com o jornalismo literário e especialmente com o estado da arte da atividade. No Brasil, muitas vezes,  acontece de profissionais saberem só um pouquinho de jornalismo literário e acharem que conhecem tudo.  É aquela história das pessoas que são levadas vendadas até um elefante e lhes perguntam o que estão tocando.  Cada pessoa só toca uma parte, a tromba, o rabo, a pata etc.  Evidentemente, cada pessoa só vai descrever o pouquinho que tateou, deduzindo ter visto e entendido o todo.


(ABN) Como isso poderia ser feito?


E.P – Jornalismo literário não é só jornalismo de matérias longas, nem tem apenas um gênero narrativo ou uma forma de expressão disponível no seu arsenal de recursos de captação, análise, interpretação e expressão da realidade. Ao contrário, são muitos os recursos narrativos da tradição, vários os gêneros que o jornalismo literário trabalha. Dentre eles, por exemplo, há a tradição do texto curto, adaptável ao dia a dia.

Depois de realmente se darem ao trabalho de conhecerem de verdade o jornalismo literário, então os profissionais podem adaptar seu modo de fazer às condições disponíveis no seu ambiente de trabalho ou mudar essas condições em alguma medida, claro, porque não dá para alguém  chegar à redação às 13 horas, receber cinco pautas para fazer com levantamento e apuração exclusivamente por telefone e internet e entregar cinco belas pautas produzidas ao editor às 18 horas, para o fechamento do veículo. Mas, conhecendo de fato o jornalismo literário, sendo criativo e  se inspirando em iniciativas engenhosas, especialmente de mercados onde o jornalismo literário é mais maduro, dá para se encontrar soluções. É uma questão de conhecimento e boa vontade.


(ABN) O senhor pode citar alguns exemplos?
E.P – Por exemplo, participei de uma conferência internacional de jornalismo literário em Boston, há uns anos, onde moderei um painel no qual a editora de um jornal de porte médio no Estado da Virginia, The Virginian-Pilot, contava a estratégia adotada para praticar jornalismo literário no periódico. Simples:  criaram uma editoria de jornalismo literário, escolhendo a dedo profissionais da redação que conheciam muito bem o jornalismo literário e tinham perfil para praticá-lo. Não é todo o mundo que tem o perfil adequado e não basta ter lido um livro do Truman Capote para se achar que se é mestre em jornalismo literário. Assim, todo o dia na reunião de pauta geral do jornal, essa editora de jornalismo literário estava presente e em conjunto com os colegas decidia qual assunto do dia teria cobertura em estilo de jornalismo literário. Feito isso, uma cobertura de um incêndio na cidade, digamos, lá ia para campo um repórter de Cidade, para fazer o feijão com arroz da notícia. E ia junto um repórter da Editoria de Jornalismo Literário, para captar o que fosse possível daquele assunto sob o olhar de alguém que pesquisa a realidade e mergulhar nela com a sensibilidade profunda de um escritor e a habilidade narrativa de um estilista, tudo sedimentado por uma alta dose de empatia humana. No dia seguinte, o jornal dava a matéria básica do incêndio e também um texto paralelo que seria, por exemplo, o mini-perfil da primeira pessoa que alertou os bombeiros sobre o incêndio ou que foi lá salvar alguém por conta própria ou que reagiu de tal modo interessante à situação. O repórter de jornalismo literário continua na pauta, nos dias seguintes e prepara para o fim de semana uma longa matéria  sobre os personagens reais envolvidos naquela situação, suas histórias de vida, seus episódios.


(ABN) Esse modelo também pode ser produzido no jornalismo digital?
E.P – No Brasil, praticamente se implantou essa “verdade” de que texto longo não cabe na Internet, o leitor não tem interesse. Creio que isso é muito mais uma acomodação e preguiça dos profissionais do que propriamente uma verdade incontestável do comportamento dos leitores. Se você oferece um material de qualidade, muito bem escrito e que absorve as condições tecnológicas dos novos meios e sua linguagem, o leitor sim pode se interessar e muito por matérias longas.  Mas, claro, você tem de saber usar as novas condições. Tem de oferecer material de qualidade e atraente.


(ABN) Como esse material pode ser oferecido de maneira atraente?
E.P – Dividindo textos longos em capítulos. Publicando matérias longas em série, com um capítulo por dia, por exemplo.  Inserindo infográficos e recursos audiovisuais, se possível dotados de interatividade.  É assim que jornais como  o Los Angeles Times resolvem o problema. É assim que surgem novidades muito criativas, como a da revista eletrônica Atavist  onde o texto escrito longo e os recursos audiovisuais se casam muito bem, na esfera digital.  E com a vantagem comercial extraordinária do leitor não precisar comprar a revista inteira, se o interesse dele é apenas por uma matéria específica. Ele simplesmente vai lá na página digital da revista e compra exclusivamente a matéria que lhe interessa. Temos que pensar fora da caixa preta e do condicionamento do passado, para termos resultados positivos. No Brasil, toda a vez que algum veículo experimentou produzir matérias em estilo de jornalismo literário, mesmo grandes e no formato digital, como por exemplo o Diário do Nordeste  fez há algum tempo em matérias de Beatriz Jucá, pós-graduada em jornalismo literário, a recepção do público, tudo indica, foi boa.  Nos Estados Unidos, há mais de dez anos longa pesquisa mostrou que entre o texto informativo seco e superficial da maioria das matérias jornalísticas, e o texto em estilo de jornalismo literário, o público prefere esse segundo.  E óbvio, pois a linguagem do jornalismo literário transporta a tradição milenar da arte de contar histórias, adaptada, pelas ferramentas intelectuais modernas, a essa tradição nobre da prática jornalística.

(ABN) Em um de seus textos o senhor afirmou: “É isso que vale a pena fazer com o jornalismo: colocar tudo no papel com estilo”, o que o senhor quis dizer com essas palavras?

E.P –
Escrever com alma.  Produzir textos que não sejam enfadonhos. Unir a exatidão e a precisão de apuração dos fatos à beleza da linguagem poética e metafórica.  Descrever retratos humanos dignos.   Tornar a leitura uma experiência prazerosa ao leitor e que o ajuda a entrar profundamente no entendimento da realidade contemporânea e das vidas humanas, longe da superficialidade louca e rasa que mais confunde, muitas vezes, do que exatamente informa e esclarece.

(ABN) Como a comunicação de massa moderna, incluindo o jornalismo, mascaram o pensamento do telespectador?
E.P – Na maior parte da sua produção, a comunicação de massa moderna pode ser muito atraente, visualmente, sedutora.  Mas a base de entendimento da realidade que está no fundamento de seu conteúdo é tosca, rasa, antiquada, estruturada numa visão de mundo do século XIX.  Ora, já estamos no XXI, muitas coisa nas áreas nobres de conhecimento da realidade, como na ciência de vanguarda, já mudaram. O material  que vemos é em parte resultante da interação entre a matéria e o universo sutil que nos rodeia.  Essa interação ocorre de um modo muito diferente, complexo, quando comparado ao reducionismo simplista da ciência atrasada do século XIX.  Só que o jornalismo, na sua maior parte, continua com a visão obsoleta dessa ciência.


Junto com essa visão limitada e distorcida, boa parte da comunicação de massa continua a insistir em demasia com a produção e distribuição de conteúdos absolutamente negativistas, só tendo espaço e tempo para os assuntos sombrios da alma humana, da crueldade e da loucura como espécie e da ignorância mortal da nossa civilização que nos está encaminhando para o suicídio coletivo involuntário com a contaminação desastrosa e trágica dos oceanos, por exemplo.


(ABN) Como os conteúdos negativos e positivos impactam a sociedade?
E.P – Esses conteúdos negativos não são gratuitos. Provocam um efeito deletério na psique coletiva, mancha a segurança interna das pessoas, criam o medo, espalham o ódio e auto ignorância, estimulam o desastre. Vários estudos de ponta da psicologia social já demonstram isso.  Quando, no entanto, a comunicação de massa também traz conteúdos positivos, inspiradores, isso acalma e ilumina o  inconsciente coletivo e as pessoas sentem-se atraídas a fazer o melhor, ajudando a realidade manifestada a se tornar mais saudável e harmônica.  Então, muitas vezes, a comunicação de massa, com o poder que tem, é um cego ignorante provocando o encaminhamento de outros, mais cegos ainda, para o abismo.  É necessária uma profunda revisão e autocrítica humilde dos líderes da comunicação de massa e uma tomada de atitude moral, além de muita educação e atualização, para produzir o que vocês da Boa Notícia estão fazendo, por exemplo, e que o movimento Voices of Hope – Vozes da Esperança –  está fazendo nos Estados Unidos e noutros países, estimulando a mídia a produzir também conteúdos redentores e transformadores.  É um muito desse  conceito e dessa abordagem, direcionado à produção de narrativas biográficas, que estarei compartilhando no workshop que darei em Fortaleza nos dias 22 e 23 de abril.



“Muitas vezes, a comunicação de massa, com o poder que tem, é um cego ignorante provocando o encaminhamento de outros, mais cegos ainda, para o abismo”



(ABN) O que seria a postura proativa dos profissionais da comunicação?

E.P –
Normalmente o jornalista, em particular, tem uma atitude reativa, por vício dessa atividade. As notícias são dependentes do que aconteceu de maneira destacada na sociedade.  Os jornalistas ficam reféns de algo acontecer e bombar na sociedade para noticiar.  Digamos que a mídia noticia o Justin Bieber no Brasil porque o rapaz vende milhões e atrai milhões para seus shows. Tudo bem, mas será que esse tipo de música é interessante para a sociedade brasileira no momento, especialmente para os jovens?  Será que existe nascendo em algum canto talvez inesperado do país ou do exterior algum estilo musical muito mais criativo e interessante, mas que não está recebendo os holofotes da mídia porque ainda é conhecido de poucos? Não seria mais útil para a sociedade registrar esses experimentos diferenciados e que contribuem para um mundo melhor e para as pessoas estarem mais conscientes, despertas e felizes? Isso é ser proativo. Não ficar à mercê do que é moda.  Antecipar possibilidades, acompanhar experimentos inovadores e não ficar arrogantemente desprezando, por preconceito, propostas novas que ainda não caíram no gosto popular mas que são, às vezes, contribuições extremamente saudáveis para a sociedade.  É fundamental que o jornalismo conquiste essa postura proativa para se antecipar e não ficar preso ao passado. O jornalismo tem de ser, mais do que uma atividade voltada para o passado (muito) e para o presente (pouco), uma atividade voltada para o futuro.

(ABN) “O jornalismo não pode fugir do seu compromisso com a vida”, explique esse pensamento.

E.P –
Nos itens anteriores, comentei como o jornalismo, involuntária ou voluntariamente, muitas vezes, por ignorância e falta de atitude reativa, está trabalhando pela manutenção da massa num nível muito limitado de compreensão da realidade. Quando faz isso, está ajudando não as pessoas a evoluírem, mas a involuírem. Quando a humanidade não evolui, no estado de consciência limitado em que nos encontramos, o efeito danoso da tecnologia cega e da ignorância humana com relação à existência é perigosamente letal para a vida no planeta. Para toda a vida, dos ecossistemas, das criaturas, da espécie humana.  Seria papel da imprensa dar atenção a isso há muito tempo, mas ficou inerte e pouco fez, assim como pouco fez no combate às atitudes brutais da nossa ignorância e lançarmos o plástico e lixo nos oceanos, com isso matando peixes e poluindo as águas no  nível absurdo em que se encontram os oceanos.


(ABN) Como o jornalismo pode corrigir ou amenizar isso?

E.P –
O jornalismo precisa direcionar seu potencial e sua inteligência à promoção da expansão de consciência das pessoas, e não ao aprisionamento que faz, por exemplo, boa parte do público não entender porque um  líder populista manipulador das massas que diz defende-la é o causador de desastres que na verdade fazem com que os inocentes que o apoiam sofram hoje, eventualmente,  as consequências das ações destrutivas provocadas por alguém desse tipo, quando une o poder à sua santa ignorância da realidade sistêmica da existência.  A mídia não pode continuar vendendo o consumo como o supra sumo da felicidade humana, quando de fato já sabemos a paz de espírito e a capacidade de passar pela vida em harmonia com a existência requer autoconhecimento, e não aprisionamento das mentes e dos corações em programas de domingo absolutamente banais que congelam as pessoas num nível que com o tempo pode contribuir para uma estagnação da evolução das pessoas para melhor.

(ABN) Nos últimos dez anos houve uma transformação significativa na tecnologia. Vivemos a chamada “era pós-moderna”, do imediatismo e da falta de privacidade. Sendo profissional da comunicação, como o senhor avalia essas grandes mudanças?
E.P – Essas tecnologias trazem aspectos benéficos e maléficos, como tudo na existência.  É sensacional para mim, como escritor por exemplo, que eu possa fazer uma entrevista com alguém por Skype, no exterior, ou que consiga pesquisar rapidamente na internet muita coisa que eu levaria anos para levantar, para os meios antigos. Contudo, é tarefa da sociedade – no âmbito cultural e educacional, especialmente, assim como no campo do desenvolvimento, alertar as pessoas desses efeitos colaterais indesejáveis.  Por exemplo, a capacidade de focar e se concentrar fundo num tema, para que você possa realizar alguma coisa importante na vida, está sendo combatida ferreamente pelo celular.  Nossos cérebros estão sendo morfologicamente alterados para não pensarmos bem e profundamente.  A distração e a desconcentração, pelo excesso de estímulos aos sentidos, é uma tragédia.  Há toda uma geração com dificuldade de pensar, de estabelecer relações entre causas e consequências de uma situação. O analfabetismo funcional é uma realidade. As pessoas lêem, mas não entendem, não captam o sentido, muitas vezes, por esse excesso de hábito distorcido de uso dos meios eletrônicos.  A mente humana é muito infantil, de um certo modo, caindo fascinada na magia luminosa e sedutora dos meios eletrônicos. A dependência por esses meios pode provocar um afastamento de si mesmo e uma alienação perigosa para a saúde mental dos indivíduos, dos grupos sociais, da sociedade como um todo.


(ABN) O senhor é contra a tecnologia?

E.P –
Não sou radicalmente contra a tecnologia. O que deve haver, por parte dos comunicadores, é aproveitá-la com consciência e não atuar no mundo superficialmente fascinados pela pirotecnia tecnológica.   É saber, sempre, que há um compromisso moral necessário para com a sociedade, no sentido de estar contribuindo para as pessoas evoluírem, e não se estagnarem na superficialidade maquiavelicamente enganosa da máquina.  Desde que a tecnologia seja acompanhada de consciência estimulada para que não se reduza a ação humana ao que a máquina – e os interesses por trás dela – propõe, pode ser interessante o desenvolvimento de novas possibilidades, como essa de eu estar realizando com vocês esta entrevista por email.  Mas tudo, no fundo, tem uma questão de consciência importante que jamais podemos esquecer. Queremos que a comunicação esteja a serviço de uma humanidade a caminho da iluminação e do despertar, ou a serviço da trogloditização disfarçada em roupas de acrílico? No que me toca, e no alcance máximo das minhas limitações, alinho-me, na prática e na teoria, com os muitos de nós que, graças a Deus, estão utilizando a comunicação para o bem e para a evolução.

Serviço

Workshop sobre Narrativas Biográficas

Dias 22 e 23 de abril, no HG Office Varanda Mall

Avenida Senador Virgílio Távora, 999 – Sobreloja 1, Aldeota.

As inscrições estão abertas.

Mais informações: http://www.edvaldopereiralima.com.br

 ou com Emmanuel Montenegro: (85) 99610.9329 /

E-mail: emontenegro@edicoesbpm.com.br
http://edicoesbpm.com.br/.


 

 

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