Buscando soluções para garantir à criança institucionalizada uma família que a ame e crie, a Lei 12.010/09, que já foi sancionada pelo presidente Lula e entrará em pleno vigor em novembro, previu a obrigatoriedade de se examinar semestralmente a situação da criança abrigada. O objetivo principal é obter a reintegração familiar e, se esta não for possível, a colocação em família substituta.


A nova lei também acrescentou a possibilidade de que a colocação em família substituta se dê entre parentes da criança ou adolescente, desde que existente relação de afinidade ou afetividade, a fim de evitar ou minorar as consequências decorrentes da medida. Essa medida deve ser aplicada com extremo cuidado, para que não se crie uma preferência unicamente baseada na consanguinidade, porque a colocação deve ser feita em ambiente que seguramente possa dar boas condições para a evolução da criança ou do adolescente.


Com efeito, a natureza jurídica desta família extensa é exatamente de família substituta, já que o núcleo familiar legal básico é formado pelos genitores, que recebem as obrigações inerentes ao poder familiar. No momento em que a criança é afastada de seus genitores, é necessário que se defira à alguém sua guarda legal, ainda que provisória. Neste caso, existindo algum parente com quem a criança tenha vínculos de afinidade e afetividade, estes requisitos é que justificam a aplicação da medida de acolhimento por esta família extensa.


Neste diapasão, a solução da colocação da criança com parentes com quem tenha afinidade e afeto deve ser precedida de rigoroso estudo, assim como qualquer colocação em família substituta, com especial enfoque para a possibilidade de repetição no seio desta família extensa dos problemas que originaram seu afastamento dos genitores. E, não é demais reafirmar, a natureza jurídica desta colocação é de guarda legal, devendo o parente guardião cumprir todas as exigências legais típicas deste instituto.


Esta preocupação legal com a criança colocada em família substituta vem expressa no parágrafo 5o do artigo em tela, que dispõe sua preparação “gradativa” e acompanhamento posterior, realizados pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com o apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar.


O vocábulo gradativa deve ser interpretado sistematicamente, já que todo o espírito da lei aponta para a necessidade de celeridade na solução da institucionalização da criança. O que se quer evitar é que existam colocações precipitadas, sem estudo ou preparação. Mas tal assertiva não pode justificar a demora na colocação da criança na família, que é o ambiente ideal para sua criação e formação.

O acompanhamento posterior é salutar para auxiliar na adaptação da criança ou adolescentes, sobretudo quando tem histórico de vida de abandono e institucionalização.

O que importa afirmar é que a família ampliada só terá a possibilidade de ficar com a criança quando esta for uma solução apontada por vínculos de afeto e afinidade por parte da criança e que os parentes estejam dispostos e tenham condições de criá-la. A Constituição do Brasil não tolera predileção por pessoas apenas por vínculos sanguínios, já que a criança não é coisa que possa pertencer a quem quer que seja. Além disso, a colocação deve ser feita preferencialmente na modalidade da adoção, que a preserva mais os direitos da criança. Se houver amor, será uma boa solução.

* Artigo publicado em 16.10.2009 no jornal O Estado e reproduzido neste site com autorização do autor.




Sávio Bittencourt

Promotor de Justiça (RJ). Formado em Direito (Universidade Federal Fluminense – UFF). Mestre em História Social (Universidade Severino Sombra – USS).

savio.estado@terra.com.br

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