Não se pode ignorar a miséria e o sofrimento deste mundo, a grande quantidade de sofrimento que cobre a humanidade desde a sua origem, sabendo que na Terra já viveram mais de 80 bilhões de seres humanos, dos quais muitos tiveram uma existência dolorosa e fatídica. Por que e até quando durará essa tragédia?
Os breviários de todas as religiões declaram que a vida tem um significado, mas quantos homens e mulheres, dessa infinidade de seres humanos, foram capazes de encontrá-lo? Quantos puderam ter acesso à consciência de uma nova vida espiritual? Quantos viveram como bestas, com medo, com necessidade de sobreviver, com a dor de uma doença? Quantos tiveram a oportunidade de poder refletir sobre o significado existencial?
Questões dessa natureza são levantadas todos os dias sem uma resposta convincente. Por quê? Por que o mundo? Por que a vida? Para que a existência humana? A incerteza e a incapacidade de se revelar tudo o que é, tudo que dá origem ao Universo, desafia a inteligência humana. Que sentido tem tudo isso? Para onde caminha a humanidade? Por que comigo? Por qual motivo? Por quê?
O desafio permanente é encontrar um sentido que justifique tudo isso, porque uma vida que depende apenas de uma coincidência, em última análise, não merece ser vivida.
Não se pode negar, no entanto, ainda que pareça uma contrariedade, que a vida tem o seu próprio mecanismo de equilíbrio. Tanto o mal, quanto o caos e a destruição são impulsos evolutivos do Cosmo. Todo o desvelar da vida acontece paulatinamente e por contraste, porque o Universo cria por meio de contrastes. Logo, o avanço da espécie humana dar-se à medida que essas tensões fazem sofrer. É nos períodos de maiores incertezas que acontecem as mais significativas mudanças e novas possibilidades de vida, um salto para o melhor.
Por essa razão, há quem diga que existe “algo absoluto” que dá sentido à vida, embora haja muito desacordo quanto a sua essência e natureza. Defendem que existe, na consciência humana, uma presença com a qual se estabelece diálogos e satisfaz o que se aspira e o que se ampara. Alguns chamam essa presença de Deus, outros de Unidade, de Energia, de Mãe-terra, de Cosmo, que dá sentido a tudo.
Muitos são os absolutos: amor, unidade, criação. Mas, o que é o mundo senão isso? Como nasceu o Universo senão de um processo criativo continuado a partir de uma unidade em expansão? E o que pode haver por trás desse processo senão uma consciência? E de que natureza pode ser essa consciência, se não for amor? Assim, no final, o que acaba por ser mais importante na vida, o que dá sentido a ela, é poder experimentar essa consciência. Sentir-se acondicionado por esse amor e interagir com ele, realizando a própria vocação, superando as adversidades e, a partir daí, extrair as lições que, de conformidade com o grau de evolução de cada um, permitem encontrar o sentido da existência, entre as aparentes contradições e as momentâneas injustiças, inerentes à condição humana na Terra.
Seja como for, por enquanto, é preciso aceitar que a vida é um mistério para viver e não um problema a resolver.
* Artigo publicado em 06.07.2010 no jornal O Estado e reproduzido neste site com autorização do autor.