Projeto, que produz vídeos curtos, traz histórias incríveis de pessoas comuns. Vidas Contadas é realizado pela jornalista Verônica Machado, de Brasília, e prioriza a linguagem de não violência.



Foto: Reprodução / Facebook


José Machado saiu do interior do Ceará, em 1962, para ajudar a construir Brasília. Viajou durante 12 dias em um pau de arara, e participou da construção da Universidade de Brasília. Ele nunca teve a oportunidade de estudar na instituição. Papelão recolheu livros do lixo e, hoje, tem um acervo com mais de mil obras. Luciana enfrentou um câncer muito jovem. Atualmente, ela ajuda mais de 15 mil pacientes de câncer com o projeto Continuar Sorrindo. Esses são alguns dos personagens retratados no Vidas Contadas (www.vidascontadas.com), um projeto de vídeos curtos, da jornalista Verônica Machado. Personagens não! Pessoas reais, anônimas, que transformaram dores em grandes histórias.


Vidas Contadas nasceu de um anseio da jornalista. Ela era repórter do Correio Braziliense e enfrentava uma crise existencial com a profissão. Decidida a mudar o rumo da vida, Verônica vendeu tudo o que tinha e passou seis meses estudando no exterior. Ao retornar, tinha uma certeza, não queria trabalhar novamente em redação de jornal. Tateando, para descobrir o que desejava realmente fazer, foi surpreendida com o óbvio apontado por um amigo. “Ele disse que eu tinha um dom muito estranho, que era saber a história inteira de uma pessoa em cinco minutinhos. E em qualquer lugar, em uma festa, na parada de ônibus… E ele tinha razão. Amo ouvir e contar histórias”, recorda a jornalista.


A descoberta, compara Verônica, despertou nela sintomas físicos de uma pessoa apaixonada. “Reparei que quando eu ouvia as pessoas e conversava com elas, meu coração batia mais forte a respiração ficava ofegante. Foi aí que descobri que minha missão era ouvir e contar a história de pessoas comuns. E todas – todas, mesmo – têm uma boa história para contar”, afirma.


Nascia, bem ali, o Vidas Contadas. Em abril de 2015, a jornalista criou uma página no Facebook, um site simples e divulgou a primeira história. “O feedback das pessoas foi muito bom e me incentivou a continuar.  Publiquei, então, mais cinco histórias. E o projeto deslanchou. Escolhi contar a história de pessoas anônimas porque são, para mim, tão fascinantes quanto as de pessoas famosas. Ouso dizer que até mais sinceras. Histórias que, geralmente, não têm espaço na grande mídia”, reflete.


Após as cinco primeiras histórias publicadas, o Vidas Contadas recebeu apoio de 37 pessoas em um financiamento coletivo do Catarse para a construção de mais oito histórias. “Depois dessa série, eu mantenho o Vidas com meus próprios recursos e rendimentos de projetos paralelos”, conta a jornalista.

Inspiração

Mas, onde encontrar essas grandes histórias? Verônica relata que não precisou ir muito longe, elas estavam por toda parte. “Nunca precisei me esforçar muito para encontrar. Eu sentava com meu avô, gravava e tinha uma ótima história. Alguém me falava sobre uma pessoa com um causo interessante e eu ia até ela. Eu esbarrava em acontecimentos na rua e eu precisava ouvir a história dos personagens. Minha conclusão é que há sempre boas histórias por perto. A ideia do Vidas é ter essa espontaneidade de ficar de cara com um boa história e registrá-la. Não tem regras, editorias, limite de tempo, de pessoas, estilos… O Vidas é livre, assim como as histórias que conta”, detalha.


Inicialmente, Verônica planejava fazer simples registros. No entanto, o tempo e a repercussão mudaram os planos da jornalista. “O Vidas criou alma e percebi que virara uma coleção de ensinamentos e inspirações. E fazia bem para mim, que ouvia e contava as histórias, para o personagem, que era ouvido, e para o público, que recebia o presente de saber um trecho importante da vida de alguém”.

Afeto e memórias




Foto: Arquivo Pessoal


Dona Pifa, a mulher mais velha a fazer uma tatuagem, e Verônica Machado


O Vidas Contadas mexe com sentimentos, memórias, afetos. O projeto é também um meio de comunicação que prioriza a linguagem de não violência. “São histórias que pacificam. O Vidas é um acervo de pessoas que transmitem esperança de um mundo melhor. Em um cenário com tantas notícias ruins, deparar-se com um conjunto de histórias inspiradoras para o bem é até surpreendente. O Vidas é uma iniciativa que levanta a bandeira da paz”, pondera Verônica.


Para Verônica, o formato do Vidas Contadas representa uma das inúmeras possibilidades de fazer jornalismo na era digital, que proporciona a interação, o compartilhamento e entrega de valores.

Futuro

Para o futuro do projeto, Verônica planeja conseguir parcerias com jornalistas de outras partes do Brasil e, assim, expandir o conteúdo do Vidas. “Mas, sem perder a magia da espontaneidade e simplicidade do conceito inicial”.


Além do Vidas Contadas, Verônica Machado coordena o blog Jornalista 3.0. Leia aqui uma entrevista com Verônica sobre as novas possibilidades do jornalismo.

Lições de vida

Verônica Machado separou algumas histórias que marcaram o Vidas Contadas e quais lições aprendeu com elas.


Amor além da vida: Dona Albertina mudou a visão sobre a morte depois que receber a carta psicografada do filho. Uau! Uma lição de fé para mim. Conversar com dona Albertina, ver e pegar a carta, ressuscitou em mim uma crença de que existe algo mais depois da vida.



Foto: Reprodução / Internet


No reino do Papelão: Papelão faz esculturas com o que encontra no lixo. E montou um acervo com mais de mil livros que as pessoas jogam fora.

Essa história me fez perceber o quanto desperdiço coisas importantes e o quanto posso julgar as pessoas pela aparência.


O Candango: José Machado saiu do interior do Ceará para construir a capital em 1962. Foi em um pau-de-arara durante 12 dias. Ajudou a construir a Universidade de Brasília e nunca teve a chance de ser um aluno de lá. Esse é meu avô. Sentei com ele no quintal e nunca, depois de 25 anos, tinha parado para ouvir a história dele. Emocionante conhecer minhas raízes e a força trabalhadora da minha família.



Foto: Reprodução / Internet




A Arte de Servir : Seu Orlando trabalha há 63 anos na Confeitaria Colombo, a mais famosa e antiga do Rio de Janeiro. Ele já serviu Getúlio Vargas, Rainha Elizabeth, Tancredo Neves e outras personalidades. Lembra em que mesa sentavam e o que pediam para comer. Impressionante. Orlando me ensinou: faça o que for, mas faça bem. O segredo da felicidade é amar o que faz. Amei.


A fé que cura: Luciana é uma moça sensacional que, aos 21 anos, teve um linfoma. Ela se curou, mudou a vida inteira e hoje ajuda mais de 15 mil pacientes de câncer com o projeto Continuar Sorrindo. A Lu é exemplo de doçura e sabedoria, mesmo tão jovem. A lição dela é que a doença pode vir para o bem, para transformar a vida de alguém — pelas palavras dela.



Foto: Reprodução / Internet


O poder do querer: Flávio Pala foi atropelado por uma ambulância na principal avenida de Brasília. Teve mais de 100 lesões cerebrais. Ficou em coma. E conta como foi a recuperação surpreendente. Ele estava me dando a entrevista dois anos depois do acidente e já tinha voltado para faculdade. Os médicos tinham dito que se ele sobrevivesse, estaria em estado vegetativo. Veja que não é bem assim, né?! A lição do Flávio é: você pode muito se quer muito.


Dona Pifa: A senhora mais velha a fazer uma tatuagem, que pode entrar para o Livro dos Recordes. Nossa! Que humor sensacional. É impossível assistir e não querer ser como dona Pifa ao envelhecer. Uma mulher de 100 anos que dá um banho de ânimo em qualquer moleque.


À primeira vista: um casal cruza olhares na rua e se apaixonam perdidamente. Eles estão há 10 anos juntos, como se tivessem conhecido ontem. Eles contam o segredo para um relacionamento tão intenso e duradouro: fazer o outro feliz. Grande lição.


O valor da liberdade: Seu Ceará foi escravo em uma fazenda no interior do Pará. E só escapou porque ficou amigo do capataz. Fiquei maluca com essa história. Valia um filme. Lição: faça amigos.



Foto: Reprodução / Internet




Instinto paterno: Willians foi um pãe (pai + mãe) ao cuidar do Pedro sozinho durante 18 anos. Construíram uma relação forte. Pedro sofreu um acidente em uma cachoeira e Williams tenta se recuperar da perda.

Lição: é preciso amar como se não houvesse amanhã. (vídeo mais assistido do Vidas)


Sopa com amor: Duas amigas se unem todas as quintas-feiras para fazer sopa para quem tem fome. Tudo é doação. Didi e Célia são dois amores e exemplos de pessoas boas nesse mundo. A experiência de doar sopa na porta dos hospitais é extremamente gratificante. Fui com elas e nunca vou me esquecer. Lição: generosidade e amor ao próximo.


Princesa do xaxado: Sabrina lidera um trio de forró pé-de-serra. E conta como foi que chegou à paixão do forró e, ainda mais, nos vocais.

Estar em um ambiente, geralmente, liderado por homens, é um desafio ainda para Sabrina. Oh, mulher porreta, forte, determinada e que sabe o que quer. Lição: tenha determinação.



Foto: Reprodução / Internet




Família: Dhanya teve uma filha linda, o relacionamento com o pai da criança não deu certo. Mas ela encontrou apoio em outro grande amor: uma mulher. Aqui, é uma lição de amor e respeito.


Contador de histórias: William é um contador de histórias profissional. E como seria a história de um contador de história? Ele me ensinou o poder que cada um tem ao contar uma narrativa. Ótimo!


Série Jovens Empreendedores: Aqui são mais quatro histórias. Todas elas com a mensagem de não desistir nunca. Jovens realizadores, empreendedores, exemplos.


O balé dos dedos: Genilda é uma pernambucana, que faz renda renascença, arte que aprendeu a fazer com a mãe. Ela conta o que passou quando criança, o sonho de montar uma escola de artesanato e as lições da vida.Ah, Genilda é maravilhosa e me ensinou que é preciso terminar o que começamos.


Saiba mais
Vidas Contadas
Jornalista 3.0

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