No Planeta, pelo menos 2, 5 bilhões de pessoas foram afetadas por desastres naturais nos últimos dez anos; um aumento de 60% em relação à década anterior, segundo a ONU. O ano de 2010 bateu, praticamente, todos os recordes anteriores e 2011 já se mostra como um forte candidato a superar todas marcas. O ano que passou foi o mais mortífero desde 1983, quando a seca na Etiópia deixou 300 mil mortos. A média dos últimos 30 anos é de 66 mil mortes por ano.
No Brasil foram aproximadamente 13 milhões de brasileiros na ultima década, incluindo janeiro de 2011, o que nos coloca hoje entre os 10 no ranking dos países mais afetados, vitimas de catástrofes naturais.
Estima-se que até o fim deste século a temperatura média da Terra deverá subir, consideravelmente. Com temperaturas mais altas, o Planeta vai tornar-se cada vez mais inquieto e o humor da Terra tende a piorar muito. Exigirá das expressões de vida que pululam o Planeta, capacidade de adaptação em períodos cada vez mais curtos. Este é o custo ambiental do chamado crescimento econômico, do que definimos como civilização.
Diante de uma catástrofe natural, somos, infelizmente, ainda levados a reflexões basicamente religiosas, a acreditar tratar-se de ação divina ou levados a pensar em nível de escatologias apocalípticas, fundamentadas em profecias oriundas de variadas crenças. Geralmente, tais profecias, de fato, nada prevêem e nada acrescentam, sendo convenientemente forçadas a acomodarem-se a eventos já ocorridos.
Dentro do cristianismo, cada nova catástrofe é uma evidência de que o mundo está acabando, a grande tribulação está se aproximando e o grande julgamento está chegando. Os bonzinhos vão ganhar presentes mas quem fez malcriações vai ficar de castigo. Lamentavelmente, a moral e a ética religiosa são ainda meritórias.
Em função, sobretudo, das crenças que nos movem, possuímos ainda muito do comportamento do homem “primitivo” quando, diante das catástrofes climáticas, eram oferecidos sacrifícios, inclusive humanos, na tentativa de aplacar a ira dos deuses. Hoje, continuamos a nos deixar atrair para os lugares considerados “sagrados”, nos rendendo aos recorrentes argumentos vindos dos púlpitos, rádio, televisão, internet, que apontam para o juízo de Deus e a feiúra do diabo. Entretanto, não raras vezes, tais proféticos argumentadores aproveitam para assaltar a carteira dos amedrontados ouvintes. Afinal, aplacar a ira dos deuses é preciso.
Um dos efeitos positivos é que catástrofes sensibilizam, geram reflexões, oportunizam o debate e a busca de respostas, podendo nos fazer acordar da hipnose na qual geralmente nos encontramos. Digo podendo nos fazer acordar pois, infelizmente, os pensamentos, sentimentos, comportamentos e respostas que produzimos nestas circunstâncias, costumam simplesmente reproduzir programas já instalados no subconsciente.
Não podemos, também, desconsiderar o poder das catástrofes em revelar a luz e as sombras, anjos e demônios, o pior e o melhor que existe em nós. Enquanto há os que se desdobram em compaixão, doação, acolhimento, em gestos de incondicional amor, há os que como abutres e bestas feras aproveitam inescrupulosamente da fragilidade do semelhante. Apropriam-se da generosidade alheia, tomando para si o que deveria contemplar a necessidade de pessoas feridas no bolso, na mente e na alma.
O que fazer face às catástrofes naturais que, ao que tudo indica, tornar-se-ão cada vez mais letais? Creio que precisamos de novas abordagens, outras formas de encarar dantescas situações que transcendam as crenças e comportamentos religiosos usuais.
Em primeiro lugar, entender que Deus é lei e nesta Lei está a Graça; fora dela avolumam-se os sofrimentos. Ou seja, existem inexoráveis leis universais que precisamos compreender e a elas nos adequar e isso nada tem a ver com o humor dos deuses.
Em segundo lugar, precisamos entender que as catástrofes naturais são, muitas vezes, conseqüências de comportamentos antinaturais. Ao nos colocarmos no caminho da natureza, em desarmonia, entramos em rota de colisão com ela.
Em terceiro lugar, se desejarmos continuar a existir no tempo e no espaço, necessário se faz assumir total responsabilidade pelo que acontece neste Planeta. Pesa sobre nós a intransferível e urgente responsabilidade de buscarmos alternativas ecologicamente harmonizadoras. Lembremos que, na proporção em que o crescimento demográfico satura o espaço, diminuem as possibilidades de nos perpetuarmos no tempo.
Em quarto lugar, precisamos aprender a olhar para o Planeta Terra como um ORGANISMO VIVO que ele é.
Há quase dois mil anos atrás São Paulo declarava: “Porque sabemos que toda a criação, a um só tempo, geme e suporta angústias até agora”. Parece que a Terra parou de gemer e começou a gritar, parou de suportar e começou a reagir. Como ser vivo, ela se angustia e se alegra, contrai e expande, se movimenta, exala aromas, exibe cores, emite sons, persegue a beleza, a arte, a harmonia e é envolta em mistério e magia.
Neste ORGANISMO VIVO nascemos, reproduzimos e morremos. Para entender a Terra como ser vivo basta observar este condomínio chamado corpo humano.
Sabia que sobre sua pele, neste momento, estão vivendo milhões e milhões de bactérias? Elas nascem, reproduzem-se e morrem, ou seja, passam a vida inteira em seu corpo. Todos nós hospedamos milhões de moradores em nosso corpo, vários deles são imprescindíveis ao bom funcionamento como, por exemplo, os lactobacilos que habitam o intestino.
Alguns pesquisadores afirmam que, no total, existe um número superior a 10 bilhões de bactérias nos habitando, divididas em mais de 200 espécies diferentes. Portanto, não há razão para se sentir sozinho.
Quanto a estes micro-organismos, seria muito pedir a eles que tivessem consciência de que o corpo humano é um organismo vivo. Lembrar-lhes que precisam agir racionalmente e de forma simbiótica, que devem se preocupar com o crescimento numérico excessivo, que farão bem em evitar regiões de risco, ou ainda que não devem devastar e alterar a natureza do corpo onde habitam, para a segurança deles próprios. Entretanto, não exigir de nós mesmos racionalidade, cuidado, preservação, sustentabilidade é absurdo, pois somos a consciência da Terra.
Nosso corpo tudo faz para manter o equilíbrio e a harmonia; não pensemos que a Terra agirá diferentemente. De uma forma de outra, ela se livra dos excessos, do inconveniente.
Convém lembrar que a divindade também habita a natureza e que, portanto, cuidar da Terra é uma bela forma de cultuar o Criador. As mãos que cuidam podem ser mais santas que os lábios que oram. Ao ferir a Terra hoje, estamos produzindo os gemidos e as lágrimas das próximas gerações.
* Artigo publicado originalmente no site Somos Todos Um (http://somostodosum.ig.com.br/clube/artigos.asp?id=24899) e reproduzido neste site com autorização do autor.
* Oliveira Fidelis Filho é teólogo espiritualista, psicanalista integrativo, administrador, escritor e conferencista, compositor e cantor – fidelisf@hotmail.com