Ao entrar no elevador, percebeu a presença de um jovem. Este, cabisbaixo, não reagiu à entrada do novo passageiro. O recém-chegado, por sua vez, também se postou silencioso. De repente, percebeu que o jovem chorava, sem qualquer disfarce. O fato era incomum, mas, mesmo assim, não se encorajou a lhe dirigir a palavra. Fingiu-se alheado. Desceu do elevador, deixando, ignorado, o jovem padecente. Naquela noite, não dormiu tranquilo. De vez em quando, o jovem ressurgia em sua mente. No dia seguinte, soube que alguém se lançara do alto daquele prédio por onde passara. Seria aquele mesmo jovem que encontrara no elevador? Aquele mesmo jovem triste a ponto de não conter as lágrimas diante de um desconhecido? Por que não tivera coragem de lhe dirigir a palavra? Quem sabe hoje a notícia fosse bem diferente…

A solidariedade é um sentimento que deveria ser uma constante em nossas ações. Contudo, recolhemo-nos à medida que a sociedade se torna mais complexa e egocêntrica. A pressa, desculpada pela falta de tempo e o excesso de afazeres, passa a fazer parte de nossas atitudes. O temor de incomodar o outro ou de sermos solicitados nos mantém afastados. Regras sociais excessivas tornam-nos enrijecidos, pelo receio de sermos mal-interpretados ou considerados invasores da privacidade alheia.

Quantos equívocos em uma sociedade que tanto abomina a violência e almeja a paz. Quanta incoerência em nosso comportamento de animais ditos racionais… Será que esta razão, motivo de orgulho de nossa soberania na escala animal, também nos torna indiferentes, incapazes de dar a mão a quem necessita? Por que tanto receio, se a amabilidade abre as portas da convivência fraterna? Por que tanto desafeto no mundo que nos rodeia?

A tecnologia avança, mas o coração humano permanece adormecido perante a própria vida. Os corações parecem necessitar de grandes catástrofes para saírem do torpor emocional, filho da racionalidade exagerada. Segundo Emmanuel: “Sem o devido culto à solidariedade na vida, nossos passos, por mais firmes, não surpreenderiam à frente senão desequilíbrio e perturbação, desentendimento e morte.”

* Artigo publicado em 1º de fevereiro de 2011 no jornal Diário do Nordeste e reproduzido neste site com autorização da autora.

Celina Corte Pinheiro é médica – celinacps@yahoo.com

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