Sem crime de lesa-pátria / Moacir Maia
Ainda não sabemos explicar todas as convenções e crenças que habitam o imaginário e orientam a postura cotidiana de nossa contemporânea sociedade. Mas o fato é que, hoje, temos algumas observações que precisam ser feitas como pauta para uma reflexão sobre o comportamento de profissionais e meios de comunicação.
Na busca incessante de atrair a audiência fácil, de fisgar o público incauto, é evidente e inegável que o conteúdo, a programação de nossos veículos, resvala, de forma contundente e reincidente quase à exaustão, para a exploração daquilo que muitos teóricos da comunicação já identificaram como a apologia ao grotesco, ao desumano, ao degradante.
Consenso existe, também, de que os meios de comunicação de massa são isto mesmo, apenas meios, canais, vasos comunicantes, vias de extensão e propagação de mensagens. Não se justificam em si mesmo como a plataforma autônoma que define o conteúdo do que veicula e revela à sociedade.
É fato que, até hoje, ninguém desmentiu que o segredo, a senha de acesso a uma nova postura, está naqueles que ocupam as redações que elaboram o conteúdo e pensam a programação e pautas desses veículos.
Não é difícil imaginar que qualquer um que tente reverter esse estado de coisa deve ouvir dos mais antigos, regalados em sua zona de conforto, para “não inventar moda, afinal sempre foi assim”.
A postura meio “Gabriela”, pela qual tentam convencer que se nasceu assim, cresceu assim, que foi sempre assim, assim será para sempre é de uma hipocrisia sem limites.
A opção preferencial pelo “jornalismo cabidela”, pela super exploração e evidente banalização da violência remete, de forma indefectível, à destituição dos mais primitivos traços de inteligência outorgados ao ser humano.
É possível fazer diferente sim. É factível a migração para uma postura que permita a difusão de valores que agreguem à vida em sociedade um novo foco naquilo que projeta o crescimento do ser humano, despertando-o para uma nova percepção de sua própria conduta.
Não se faz, aqui, a apologia da boa nova inconseqüente e desviada dos fatos reais. Na verdade é uma referência à promoção do fazer em si a revolução que queremos no mundo, como apregoava Gandhi.
Como isso é possível? Basta pedir a cada profissional de comunicação que busque balizamento e inspiração no que preconiza o Código de Ética dos Jornalistas que, em seu Art. 7º, inciso V, diz: “O jornalista não pode usar o jornalismo para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime”. A reprodução desmedida, na escala da super exploração, é uma violência e nos remete a uma insistente convocação à intolerância. Precisamos entender, de uma vez por todas, que não podemos usurpar nesse arbítrio supremo de selecionar apenas o joio para veiculação em nossos meios. Isto é um crime de lesa-pátria por condenar, antecipadamente, as futuras gerações à perda da esperança.
Moacir Maia
– Jornalista
moacirmaia@click21.com.br