Este título recorda uma das seções da revista norte-americana “Seleções”. Lembram-se?
Nosso cérebro aloja endorfinas, substâncias parecidas com a morfina na sua estrutura molecular e nos efeitos sedativos e euforizantes. Os chineses creditam o sucesso da acupuntura – ao invés de anestésicos – à ativação das endorfinas pela inserção das agulhas nos “meridianos” corporais.
É a anestesia autônoma do organismo. Poderíamos também chamá-las de “eufrosinas”, promotoras de alegria.
No livro “Anatomia de uma doença”, do jornalista e médico norte-americano Norman Cousins (Bantam Books, 1979), o autor descreve sua doença reumatológica, degenerativa, a espondilite anquilosante, e como aprendeu a conviver com ela. Parecida com a artrite reumatoide, sendo uma desintegração do tecido conjuntivo, gradativamente enrijece as articulações.
De causa desconhecida, poderia resultar de envenenamento por metais pesados ou infecções por estreptococos. Além dos remédios médicos (aspirina, vitamina C, corticoides, talvez já alguns estimulantes da imunidade), resolveu exercitar suas emoções positivas, como o desejo de viver – este não é uma apenas uma abstração teórica, mas realidade fisiológica, com poderes curativos.
Usou principalmente o riso, lendo e vendo filmes cômicos, hilariantes. Após algumas semanas descobriu que dez minutos de boas barrigadas de riso lhe anestesiavam por, pelo menos, duas horas. Comprovara seu efeito terapêutico na química corporal e nos processos infecciosos. Aliás, na Bíblia já se observava que um coração feliz trabalha como um médico. Alguns neurologistas decerto reconhecem os efeitos do riso até sobre o tônus muscular.
Vários pesquisadores referiram-se às características fisiológicas da galhofa, entre eles Francis Bacon, Freud e Robert Burton. Este último, na sua “Anatomia da melancolia”, há quase quatro séculos concluíra: o riso purga o sangue, rejuvenescendo o corpo. Acredita-se mesmo no efeito medicinal das gargalhadas, ou (permitam-me o sinônimo) das casquinadas. Em verdade, essas fazem o diafragma espremer o fígado, liberando escórias orgânicas ali acumuladas.
O grande William Osler (1849 – 1919), canadense, notabilizado na Nova Inglaterra pela sua abordagem humanitária dos pacientes e incorporação do humanismo (ou humanitismo) nas suas aulas de enfermaria, denominava a risada de “música da alma”. Há alguns anos médicos japoneses, em Tóquio, passaram a empregar risadas no tratamento da tuberculose com bons resultados, pasmem.
Assim, o dr. Norman Cousins concluiu, de todo o ponto, que uma boa gaitada é uma maneira de fazer um “cooper” interno, dispensando-se as caminhadas ao ar livre. O fato remonta mesmo a Catulo, falecido 54 anos antes da morte de Cristo “Dê todas as risadas que puder”.
Além disso, o riso – como algumas doenças – pode contaminar, o que, certamente, norteou a frase de Ella Wilcox (1855–1919): “Ria e o mundo rirá com você; chore e chorarás sozinho”.
Riamos, pois.
* Artigo publicado em 10.11.2010 no jornal O Povo e reproduzido neste site com autorização do autor.
Pedro Henrique Saraiva Leão é Médico e presidente da Academia Cearense de Letras – ph.saraivaleao@bol.com.br