Em recente decisão da Justiça Federal do Rio de Janeiro, dia 16 de maio deste, sobre uma ação do Ministério Público em defesa do Candomblé e da Umbanda, atacados em vídeos postados pela Igreja Universal na internet, o juiz Eugênio Rosa de Araújo alegou não haver ofensa tendo em vista que “as manifestações religiosas afro-brasileiras não se constituem em religiões”.


Seu argumento era de que “não contêm os traços necessários de uma religião” por não disporem de um texto-base (ou seja: um livro sagrado), estrutura hierárquica e “um Deus a ser venerado”.


Após os protestos das confissões atingidas e da sociedade civil, quatro dias depois, o juiz volta atrás. “Destaco que o forte apoio dado pela mídia e pela sociedade civil, demonstra, por si só, e de forma inquestionável, a crença no culto de tais religiões, (…) para registrar a percepção deste Juízo de se tratarem os cultos afro-brasileiros de religiões, eis que suas liturgias, deidade e texto base são elementos que podem se cristalizar, de forma nem sempre homogênea”, esclareceu aquele magistrado.


Esse episódio bem demonstra que a definição ocidental de religião assentada nos pressupostos do monoteísmo judaico-cristão, ainda continua cristalizada nos meios intelectuais, educacionais e em meios religiosos tradicionalistas ou agressivamente cruzadistas e expansionistas.


Esta postura acaba alimentando visões etnocêntricas que reforçam preconceitos e intolerâncias, obstaculizando a consolidação de uma cultura religiosa pluralista para uma sociedade democrática. É preciso, portanto, repensar amplamente as bases culturais da definição de religião, ou mesmo a propriedade histórica do uso dessa palavra, a fim de evitar novos equívocos.


Marcos José Diniz Silva é historiador e professor da Uece


*Artigo veiculado no Diário do Nordeste, em 01 de junho de 2014. O texto é reproduzido neste site com autorização do autor.

 

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