Qual é a ideia que você faz do padre Cícero? Primeiro tenha inveja dele. Levava em seu coração a mais nobre das virtudes: a compaixão. Em tempo de seca, chegava à sua porta o sertanejo com sua mulher em trapos e os filhos em mulambos. No sertão em brasa, padre Cícero era sua última esperança. “Padre Cícero, meu roçado secou e eu estou aqui com minha mulher e filhos pedindo sua proteção. É tão triste ver a mulher e os filhos morrerem de fome!“
“Meu filho, o que é que você sabe fazer, além de roçar e plantar?– “Nada, Seu padre! Nasci para isso!“ A mulher se mete: “Quando ele era rapaz ele fazia umas lamparinas até bonitas!“.
“Meu filho, vou fazer um bilhete para o bodegueiro, Seu Joaquim. Ele vai ficar lhe fornecendo folhas de zinco, solda, tesoura e comida. Quando você vender as lamparinas, você paga a ele“.
O dia de Santa Luzia seria no próximo mês. “Neste ano, na procissão de Santa Luzia quero ver todo mundo de lamparina nova. Na mercearia do Seu Joaquim chegou um homem que faz lamparinas muito bem feitas“. Os milagres
do padre Cícero eram assim: práticos e simples. Bastava um pedacinho de papel e uma família escapava da miséria.
O último sermão do ano sempre terminava com o célebre pedido: “Quem roubou, não roube mais, quem matou não mate mais, quem mentiu não minta mais. Comecemos o ano novo como bons cristãos, querendo bem e ajudando uns aos outros“.
* Artigo publicado em 22.04.2010 no jornal O Povo e reproduzido neste site com autorização do autor.