Toda e qualquer sociedade humana, em todo o tempo e lugar, apresenta muitas dimensões onde encontramos elementos complementares e antagônicos, esbarrando na cooperação e na competição, na solidariedade e na individualidade, na compreensão e na discriminação, na benevolência e na crueldade, onde encontramos os conceitos de bem e do mal, de certo e errado. Em algumas sociedades o homicídio era encarado como um valor positivo. Entre os povos mexicanos pré-europeus, a imolação de crianças e virgens, um imperativo religioso. O parricídio (quando o velho não podia mais acompanhar o grupo) entre os esquimós era ritual normal. Contudo, também haviam práticas condenadas como Órion foi punido não por abater animais selvagens, mas por se exceder em práticas sangrentas e na defloração violenta de mulheres. Orfeu foi punido por sua doçura, por seu amor eterno a Eurídice e por viver em paz com os animais. É que para os gregos o pecado vinha da hibris, ou seja, do excesso. O Ocidente também arrasta atrás de si uma pesada história de violências. Para os físicos gregos tudo constituía natureza: os seres humanos, os não-humanos e os deuses.
0s sofistas e Sócrates é que deslocaram o objeto da filosofia como um todo para o ser humano. “Conhece-te a ti mesmo” (Sócrates) “O homem é a medida de todos as coisas” (Protágoras).”Muitas coisas são admiráveis, mas nenhuma é mais admirável que o homem” (Sófocles na tragédia Antígona). Não obstante todas as culturas agredirem a natureza não-humana, aparecem nelas, quem a exalte e lute por defendê-la. Yañavelkia descobre a unidade de todos os seres viventes. Mahavira e Buda apresentam um caminho de salvação para todos os seres sencientes. No mundo helênico, Xenófanes de Cólofon desconfia da superioridade humana e declara: “Tivessem os bois, os cavalos, os leões mãos, e pudessem, com elas, pintar e produzir obras como os humanos, os cavalos pintariam figuras de deuses semelhantes a cavalos, e os bois semelhantes a bois, cada (espécie animal) reproduzindo a sua própria forma (Fragmento nº 15).
* Artigo publicado em 02.04.2011 no jornal Diário do Nordeste e reproduzido neste site com autorização da autora.
Geuza Leitão é presidente da União Internacional Protetora dos Animais – Uipa – geuzaleitão@bol.com.br