Na noite da última quinta-feira, 30, a Agência da Boa Notícia entregou o Prêmio Gandhi de Comunicação 2014, no auditório Waldyr Diogo da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec). A solenidade de premiação foi antecedida pela realização do Fórum anual promovido pela ABN que, nesta edição, trouxe como tema “Comunicação e Criminalidade”. Na mesa, convidados de vários segmentos da sociedade fizeram com o público, uma reflexão sobre a desigualdade social  que impulsiona a violência, bem como acerca da responsabilidade dos meios e profissionais no enfoque sensacionalista da notícia.


Foram convidados para debater o tema: Alessandra Oliveira,  professora de Teoria da Comunicação, Produção Publicitária em Rádio e Sociedade de Informação e Tecnologias  e coordenadora do NIC – Núcleo Integrado de Comunicação da Unifor;  Flávio Ataliba, diretor geral do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica (Ipece) e ex-coordenador do Laboratório de Estudos da Pobreza (LEP) da Universidade Federal do Ceará; Luiz Fábio Paiva, professor do Departamento de Ciências Sociais e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV), da UFC;  e Marileide Luz, professora da Rede Pública Municipal de Fortaleza e coordenadora do Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza (CDVHS).


O objetivo do Fórum, segundo o professor Francisco Souto Paulino, presidente da ABN, era tentar explicitar a origem da violência, buscar entender as causas. “Com relação à comunicação, é uma tentativa para que possamos, de certa maneira, contribuir para que os profissionais e meios se aproximem da compreensão da responsabilidade de reproduzir os fatos, colocando-os na dimensão adequada, sem necessitar do instrumental sensacionalista que está caracterizada em boa parte dos espaços disponíveis na mídia”, diz.

Várias causas

O tema complexo e delicado mostrou várias faces na mesa de debate. Na análise de Flávio Ataliba, por exemplo, a criminalidade pode ser também compreendida pelo ponto de vista da Teoria Econômica. “O que leva uma pessoa a cometer um crime? Do ponto de vista econômico, a criminalidade pode ser vista dentro da racionalidade, excetuando os casos emocionais e passionais. Mas, pelo entendimento da Teoria Econômica, os crimes são racionais. Se os benefícios de cometer um crime forem maior do que os custos, que seriam punição e prisão, o criminoso terá mais incentivos para cometer o delito”, explicou Ataliba.


Apesar da racionalidade do crime, pontuou o diretor geral do Ipece, diversas são as variáveis para entender a criminalidade. Utilizando mapas que mostram o crescimento no número de homicídios em regiões do país e outros mapas que relacionam a desigualdade social, Ataliba destacou quem nem sempre uma taxa está ligada a outra. O Paraná, por exemplo, aparece com um dos menores índices de desigualdade social e alta taxa de renda per capita, porém, também apresenta altos índices de homicídios. “Isso torna o problema mais complexo. No Nordeste a taxa de homicídios vem crescendo. No Sudeste diminuindo. No Rio de Janeiro e São vem diminuindo, mas no Espírito Santo vem aumentando. Está havendo migração da criminalidade? Outro dado, o Nordeste vem melhorando a renda, a média de trabalho aumentou e a taxa de desemprego caiu, mas a taxa de homicídios cresceu. É um contrassenso. A desigualdade vem caindo e a criminalidade aumentando. Se a desigualdade tivesse forte relação com vitimização, os pontos estariam iguais, subindo e descendo juntos. Diretamente, parece não haver uma relação entre desigualdade e vitimização. A violência é um fenômeno complexo e não possui uma única causa. Temos que buscar outras variáveis”, avaliou.

Drogas

Para Luiz Fábio Paiva, o mercado das drogas não é movimentado, necessariamente, pelos pobres, mas que estes são os principais afetados. O professor faz um trabalho de pesquisa na cidade de Tabatinga, cidade que faz fronteira com Colômbia e Peru, considerada extremamente perigosa. Segundo ele, essa sensação de perigo não impera entre os moradores, que costumam afirmar que na cidade a bala tem nome e endereço certos, ou seja, morre quem tem de morrer. Ele conta que para contratar um matador, o contratante paga, em média, R$ 3 mil. Não é uma quantia acessível para quem é pobre. Paga quem tem dinheiro. O papel do pobre no mercado das drogas, analisa Paiva, é o da mão de obra. “Esse mercado não dá para ser regulado como o formal. A linguagem desse mercado é a violência. Se o compromisso não é respeitado, não tem SPC ou Serasa. A palavra é a honra. Se você não a honra, você morre. O que esse mercado gera? Um repertório de violência, que mantém esse mercado. O Estado faz um trabalho circunstancial. A polícia vai buscar as drogas na favela, concentrando as ações na periferia. Isso gera circuitos complicados para as pessoas que vivem nas comunidades. A violência repercute muito mais nas periferias”, comentou.

Pobreza

“A desigualdade social, sobretudo, em Fortaleza, já é uma violência”, pontuou Marileide Luz. De acordo com ela, não dá para aceitar que em uma área da cidade pessoas vivam menos do as que de outra região da Capital. “Não dá para admitir que numa área a morte seja naturalizada. Consideramos que a pobreza é uma violência. Tem questões que precisam ser desnaturalizadas, como essa de que a sociedade consiga viver com tanta desigualdade. Temos que ter a ética do cuidado, que é entender que todos nós temos o direito a mesma dignidade”, refletiu Marileide.

Mídia

De acordo com Marileide, a mídia cria estigmas, ao reverberar o lado violento das periferias e não ceder o mesmo espaço para as boas ações desenvolvidas nas comunidades. Para Alessandra Oliveira,  professora de Teoria da Comunicação da Unifor, a notícia poderia contribuir para a disseminação das boas notícias e não apenas para a violência.


No entanto, Alessandra destacou que um dos problemas hoje da violência retratada na comunicação é o enfoque, sempre concentrado no local, sem aprofundar nas questões macros. “1/4 das notícias são informativas, mas não são contextualizadas. A questão não é só discutir o resultado, mas também discutir o processo da redação jornalística. Quando não tem contextualização, a notícia é tratada superficialmente. Temos que fazer  uma discussão dos fatos. Isso é importante, porque o jornalismo tem o papel de dar visibilidade”, apontou.


 

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here