Há algum tempo, espantada com a importância dada pela mídia a notícias ruins, escrevi um artigo intitulado “desgraça dá ibope”, onde procurei abordar a ênfase conferida aos dramas e às tragédias pelos noticiários televisivos, tendo por consequência uma excelente audiência.


Há até bem pouco tempo, os programas policiais eram vistos com certa reticência por parte de um pequeno grupo de pessoas, a considerá-los de má qualidade, sempre a abordar a desgraça alheia com uma simplicidade quase afrontosa.


E o pior, esses programas policiais eram exibidos justamente nos horários das refeições, onde a família costuma se reunir e travar um salutar diálogo, onde os pais procuram saber acerca do dia a dia do filho, do trabalho, enfim…

 


O que hoje se constata é que todos os noticiários televisivos, sem exceção, fazem a cobertura de matérias que relatam tragédias pessoais, crimes bárbaros, praticados em situações inusitadas, assassinatos, mortes, chacinas, estelionato, roubos, sequestros, estupros, tráfico de drogas…




E não importa o canal de televisão, o horário, nada, a matéria preferencialmente enfocada tem como foco uma desgraça, seja ela qual for, contanto que seja uma desgraça.


Antes, os pais estimulavam os filhos a assistirem aos telejornais para se manterem atualizados, para saberem o que acontecia no mundo, num mundo onde política, economia, cultura, cotidiano, eram abordados com singularidade, com o objetivo de informar. E os pais acreditavam que, desse modo, os filhos não ficariam alienados.

Hoje, seja qual for o jornal televisivo, a maioria das matérias aborda algum tipo de crime, alguma desgraça, seja ela qual for. Esses telejornais disputam a mesma audiência dos programas policiais, para os quais ganham apenas no quesito produção, maquiagem, qualidades das tomadas externas, etc.


E assim vamos levando a vida, apavorados com as desgraças de que o ser humano é capaz, das infelicidades que pode provocar no seu semelhante, da dor que pode infligir ao próximo. E assim vamos ficando descrentes, embrutecidos, assustados, decepcionados, incapaz de acreditar na bondade, na decência, na solidariedade, no amor… e nossa esperança vai se arrefecendo.


Sei que desgraça dá ibope, mas será que poderíamos começar a pensar numa cultura de paz, onde os meios de comunicação podem dar maior visibilidade ao belo, ao bom, restituindo um pouco de nossa esperança no ser humano e num mundo melhor?


Artigo publicado no Jornal O Estado de 17 de setembro de 2012 e reproduzido neste site com autorização da autora


Grecianny Cordeiro é promotora de Justiça – grecianny@uol.com.br

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