A votação da PEC dos jornalistas, no Senado Federal, na tarde de 30/11, já estava adiantada, quando o senador Fernando Collor (PTB-AL) fez uso da palavra. Seu pronunciamento se seguiu ao da senadora empresária pecuarista Kátia Abreu, que desempenhou muito bem o seu papel de defensora dos interesses dos patrões da comunicação no país, clamando pela “liberdade de expressão”. Collor disse que a aprovação da matéria é o “embrião para o controle ‘social’ dos meios de comunicação”. Ele tem razão: a sociedade brasileira quer o controle social da comunicação no Brasil. Mas isso é assunto para outro artigo.

O senador alagoano não disfarça o ódio que nutre pela categoria que abriu para o povo brasileiro as suas falcatruas, escândalo que culminou no seu impeachment. E alfinetou: “Nesses últimos anos, esses cursos de jornalismo, o que mais têm feito é formar analfabetos funcionais”. A dor de cotovelo do empresário da comunicação só perde para postura equivocada e inexplicável do então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, quando em seu voto de relatoria, nos comparou a cozinheiros, que não precisam ter um diploma para fazer uma boa comida. Ambos precisam, como os advogados, os médicos, os engenheiros e tantas outras profissões que cobram conhecimento e competência de quem as exerce.

Collor abriu a sua fala se dizendo pertencer a um clã de jornalistas. Na verdade, o titulo que ele ostenta se deve ao fato da legislação permitir ao dono de jornal se auto-intitular jornalista. Os Collor são donos de um sistema de comunicação em Alagoas, como os Sarney no Maranhão, os Barbalho no Pará, Garibaldi Alves no Rio Grande do Norte e tantos outros. A Organização Arnon de Mello é um dos maiores complexos na área das comunicações do Norte-Nordeste do Brasil. O grupo foi fundado pelo ex-governador alagoano e ex-senador udenista Arnon de Mello. Atualmente, a organização é controlada pelos herdeiros de Arnon, entre eles o ex-presidente da república e atual senador.

A Proposta de Emenda Constitucional 33, de autoria do senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE)  e relatoria  do senador cearense Inácio Arruda (PC do B-CE) devolve ao jornalismo brasileiro a obrigatoriedade do diploma superior para o exercício profissional. A necessidade do diploma para ter o registro e exercer a profissão nos foi tirada em 17 de junho de 2009, por oito votos positivos contra o voto solitário do ministro  Marco Aurélio de Mello (primo do senador). Desde então, a atividade pode ser exercida por pessoas  sem nenhuma formação.

A aprovação do dia 30 é o primeiro passo de uma batalha que se apresenta, no mínimo, desequilibrada. Após uma segunda votação no Senado, que pode nos parecer tranquila – foram 65 votos a favor e sete contra – a matéria vai para a Câmara dos Deputados. É ali que legislam a maioria dos 271 políticos, sócios ou diretores de 324 veículos de comunicação, segundo o Projeto Donos da Mídia, que cruzou dados da Agência Nacional de Telecomunicações com a lista de prefeitos, governadores, deputados e senadores de todo o país, para mapear quais deles são proprietários de veículo de comunicação.

Antonio Carlos Martins de Bulhões, deputado federal pelo PMDB de São Paulo é o campeão, com sete empresas; Roberto Coelho Rocha, deputado federal pelo PSDB do Maranhão tem mais cinco. A estratégia é botar as concessões e a direção dos negócios em nome de parentes – filhos, irmãos, mulheres ou ex-mulheres, entre outros.

O art. 54 da Constituição Federal deixa bem claro que deputados e senadores, depois de empossados, não podem ser “proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada”. O descumprimento da regra implica, de acordo com o artigo 55, “perda do mandato”. O Código de Ética do Senado proíbe os senadores, no artigo 4º, de “dirigir ou gerir empresas, órgãos e meios de comunicação”, assim considerados aqueles que executem serviços de rádio e televisão.

Eles se protegem entre si, criam empresas familiares, laranjas, toda sorte de artimanha. O resultado é a manutenção no poder e a manipulação dos desavisados. Enquanto fazem a defesa da “liberdade de expressão”, discurso do qual se apropriaram para defender seus interesses. Esperamos que lhe caiba a carapuça jogada pelo senador Inácio Arruda, último a falar na votação do dia 30, palavra quase caçada pelo presidente do congresso:-  “Arguir que a profissão de jornalista criaria embaraço para a liberdade de expressão e do pensamento é um verdadeiro escárnio. O que cria embaraço para a expressão da liberdade de pensamento é o monopólio na mídia”, afirmou Arruda.

Angela Marinho é jornalista, integra a Comissão de Ética do Sindicato do Ceará e é Diretora da Federação Nacional dos Jornalistas e da Agência da Boa Notícia – angelamarinho@hotmail.com

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