A guerra dos sexos não é um tema novo. Mas assim como qualquer outra premissa recorrente, o que diferencia o caráter de uma obra é a forma como ela é contada. Talvez seja até um tema que tenha pouca força atualmente, por sabermos que as mulheres já não são mais seres sensíveis que ficam dentro de casa cuidando da família. Mas não há como negar que os costumes e tradições de alguns povos não seguem essa linha. É essa peculiaridade o foco do novo filme do cineasta romeno Radu Mihaileanu.


A trama é inspirada em um recente fato registrado na Turquia, quando mulheres muçulmanas já não enxergam no cotidiano o modo correto de viver. Elas fazem o trabalho pesado, em busca de água para o vilarejo onde moram, enquanto os homens passam o dia bebendo chá e jogando cartas, além de serem meros reprodutores. Em tempo, elas são valorizadas pelo dom da maternidade, mas isso não impede que elas continuem com o trabalho braçal, que causa machucados e até mesmo abortos durante o percurso de retirada da água. Quando Leila, interpretada pela estonteante Leila Bekhti, sugere uma greve de amor (leia-se sexo) para que os homens percebam que o valor das companheiras não está apenas nos serviços domésticos, os moradores precisam lidar com o que supostamente diz o Alcorão e essa nova realidade feminina.


Radu Mihaileanu, que já realizou obras como “Trem da Vida” e o simpático “O Concerto”, mais uma vez empresta seu talento em uma obra que reflete, por meio de olhos modernos, a inclusão de uma sociedade feminina para o povo muçulmano. Em determinado momento, Leila faz uma leitura coerente, porém estranha para aquelas pessoas que mal sabem ler (função dos homens), do Alcorão, dizendo que lá está escrito que as mulheres têm direitos iguais e que estão destinadas ao paraíso, já que são os seres divinos que procriam.


Ainda que mostre o tradicionalismo de boa parte dos homens da vila, Mihaileanu confere ao namorado de Leila, Sami (Saleh Bakri), certa tolerância ao manifesto, levando mais dimensões para aquele universo e apostando em mudanças que podem vir ou não com o tempo. Colaborando na construção desse universo em recomposição, Mihaileanu conta com um elenco afiado, abrilhantado também pelo bom humor da atriz Biyouna na pele da experiente Velho Fuzil, responsável por dar a Leila uma espécie de consultoria daquela estrutura familiar arcaica pré-estabelecida e também pelos diálogos cômicos do roteiro.


Longe de ser utópico, “A Fonte das Mulheres” atualiza um tema desgastado pelas películas sexistas por meio do bom humor e do questionamento de suas tradições. Afinal, tudo é uma questão de ponto de vista. Vale ressaltar que em momento algum o longa desrespeita tais costumes, apenas os questiona. E mais uma vez Radu Mihaileanu acerta em uma trama despretensiosa e mantém a qualidade da sua filmografia.

Resenha: Diego Benevides para o Cinema Com Rapadura (reprodução do texto com autorização do autor). Confira a resenha na íntegra em http://cinemacomrapadura.com.br/

Ficha Técnica

Direção:Radu Mihaileanu

Elenco:Leïla Bekhti, Mohamed Majd e Amal Atrach

Duração: 135 min

Em cartaz: UCI Ribeiro – Iguatemi

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