Darcy Ribeiro tinha o hábito de dizer que se orgulhava muito mais de suas derrotas do que de suas vitórias porque foi por causa delas que demonstrou toda paixão que tinha pelo Brasil. O exílio, durante a ditadura militar, a luta ferrenha para fundar a Universidade de Brasília na década de 1960 e os momentos na prisão quando um soldadinho, só para o importunar, traçou um risco no chão e disse a ele, durante o passeio de sol, para não o ultrapassar sob pena de levar uma surra.


 


Antropólogo, senador e idealizador, junto com Brizola, dos Cieps – Centros Integrados de Educação Pública que foram construídos no Rio de Janeiro e tinham o objetivo não só de ensinar mas também de acolher as crianças de baixa renda durante todo o dia para, assim, se divertir enquanto seus pais trabalhavam; se alimentar e ter tratamento médico e odontológico, Darcy Ribeiro tinha razão.


 


As suas derrotas foram, de fato, muito mais importantes do que as suas vitórias porque para um homem que dizia que nunca tinha visto um cavalo ou uma vaca sem dono, mas vivia contemplando crianças abandonadas por toda parte, é natural que amargasse muitas derrotas em sua luta por um mundo melhor.


 


No Ceará, onde a situação política não é nem um pouco razoável, as derrotas que a oposição tem sofrido na Assembleia Legislativa sucessivamente, nos lembram Darcy Ribeiro e esta frase dita por ele em um momento de euforia, e não de desabafo. Muitas, na verdade, são as frases de Darcy Ribeiro que mereciam ser reunidas e publicadas em livro assim como já se fez com Oscar Wilde e até com Napoleão Bonaparte. Dizia ele, por exemplo, que, no Brasil, o cidadão é o carro e não o brasileiro.


 


E dizia por que. O brasileiro, explicava, andava em calçadas esburacadas e ninguém se preocupava muito com isso. O asfalto, quando tem buracos, a gritaria é grande. O povo também não tem casa própria, mas quando falta estacionamento para o automóvel, a comoção é quase nacional. Tudo, aliás, é feito em função do automóvel. Ruas largas, túneis, viadutos e até aterramento de rios e lagos para não falar de algumas praias e florestas enquanto que, para os brasileiros, a providência que se toma (quando se toma) nunca são satisfatórias. Basta ver o salário mínimo.


 


Morto em 1997 aos 75 anos, Darcy Ribeiro estava em uma cadeira de rodas nesta época quando foi entrevistado por um jornalista que mal tinha saído de uma universidade e, no fim, perguntou ao repórter ainda em início de carreira se queria trocar o futuro dele pelo seu passado. 


 


Natalício Barroso – Jornalista e escritor – nataliciobarroso@hotmail.com


 


Artigo publicado no jornal O Estado e reproduzido neste site com autorização do autor

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