O por do sol é bonito porque é efêmero. Se fosse permanente nos cansaria. Nada permanece belo definitivamente. Tudo termina, até mesmo um beijo ardente.

Imaginemos por um instante que o sol jamais vai se por ou que nossa vida jamais terminará. Como nos comportaríamos? Como nos sentiríamos em relação a este dia “eterno” e à vida sem fim? O que neles poderíamos apreciar em sua definitiva repetição? É a alternância que nos possibilita tanto o amanhecer como o anoitecer. Assim também é a vida. Ela é bela em sua diversidade e temporalidade. É nessa provisoriedade que nos esforçamos para lhe dar sentido e prazer.

Tenho pensado muito nisso. Particularmente nos últimos tempos o dia tem sido curto para o tanto de vida que quero viver e para o tanto de amor que quero dar. Parece que quando ficamos mais velhos começamos a escrever as tais “cartas de amor ridículas”, subimos nos telhados, contamos a todos sobre o nosso amor, pedimos ajuda, imploramos perdão, prometemos mudanças… Até conseguimos muitas vezes, mas, em outras, o sol se põe mais cedo do que esperávamos e perdemos o que achávamos ser a nossa última chance. No entanto, para nossa grata surpresa num outro dia o sol volta a brilhar.

Como o por do sol, o entardecer da vida pode ter muitos encantos. A construção que fizemos nessa passagem pela vida é que dará sustentabilidade, alegria e beleza ao amadurecer. Isso não se improvisa. A gente constrói desde a infância, porque não há alegria do nada, mas do saldo de uma construção cuidadosa do sentido de nossa vida. O por do sol tem cheiro de saudade sim, mas é um privilégio tê-lo do que sentir saudade. “O que a memória ama fica eterno”, diz Adélia Prado. Fica eternizado em nossa memória aquilo que construímos amorosa, ética e dignamente em nosso existir.

Há certa experiência de vazio em nós que só se preenche com o sentido que damos à vida. Esse sentido terá de ser dado aos pequenos fatos do cotidiano, e até mesmo ao sofrimento. É sábio compreender que ele nos transforma, possibilita-nos crescimento, beleza interna e maturidade. Melhor que banir o sofrimento, que nem por isso se vai, seria acolhê-lo, crescer e aprender com ele. Isso seria sábio, assim como compreender e amar a vida que existe no aqui e agora, no tempo em que se vive. Na verdade, a gente só pode ser feliz agora. Ontem se foi e amanhã é talvez. A chance de ser feliz é agora ou nunca.

Sabedoria não depende de sabermos muitas coisas, mas de vivermos com intensidade, pequenas e frequentes oportunidades a que a vida nos expõe, sem deixá-las passar em branco. É possível retirar desses momentos a lição e a cota de felicidade que eles escondem.

Nos fragmentos do cotidiano podem estar contidos preciosos retalhos da vida que não temos o direito de desperdiçar. Não posso mais perder nada e nem ninguém sem amá-los e sem me deixar amar. Feliz ano novo para todos nós!

– Artigo publicado originalmente no jornal O Povo de 18 de dezembro de 2011 e reproduzido neste site com autorização da autora

 
Zenilce Vieira Bruno é psicóloga, sexóloga e pedagoga – zenilcebruno@uol.com.br

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