Imaginem que Dona Maria agora vai poder abortar pelo SUS quando não desejar mais um filho ou quando ele não for perfeitinho. É só entrar na fila as cinco horas da manhã, conseguir uma ficha para consultar um médico ou um psicólogo e esperar pela vaga no Centro Obstétrico do hospital.
Isto se ela conseguir descobrir que está com menos de três meses de gravidez, pois as menstruações de Dona Maria às vezes atrasam até dois meses sem ela saber porquê. Para isso terá que fazer um teste de gravidez e, obrigatoriamente, testes hormonais, ecografias (às vezes uma só não é conclusiva) e tudo isso se tiver muita sorte, muito tempo e muita determinação, pois em geral tais exames são marcados para daí algumas semanas ou meses.
Mas o que importa é que agora o abortamento será liberado e poderá ser feito pelo SUS. Dona Maria que tem 4 filhos, marido desempregado ou trabalhando de sol a sol com salário mínimo e ela mal sustentando a família fazendo faxinas nas casas dos condomínios fechados e tendo que pegar dois ônibus todos os dias, agora Dona Maria está livre, pode mandar em seu corpo, pode “planejar a família” e até encher o peito e dizer que tem os mesmos direitos, as mesmas liberdades que suas patroas dos condomínios de luxo onde faz faxinas por cinqüenta reais.
Ainda bem que nossos legisladores, nossos políticos e até alguns médicos têm e certamente terão a fina sensibilidade de compreender que para Dona Maria tudo o que ela e sua família precisam e mais desejam na vida é fazer aborto pelo SUS. E quantos ela quiser fazer.
E assim, serão resolvidos todos os demais problemas das milhões de Donas Marias de nosso país. Ainda bem!
* Artigo publicado no Diário do Nordeste de 31 de maio de 2012 e reproduzido neste site com autorização do autor
Franklin Cunha é médico – franklincunha@terra.com.br