A decisão pode parecer estranha. Mais estranha do que ela, é a sentença. Determinada revista de repercussão nacional chamou quatro integrantes do serviço de informação de “arapongas” e “abelhudos” e foi importunada por eles quando entraram com ação no Superior Tribunal de Justiça. Alegação: os quatro queriam receber, da revista, R$ 40 mil por terem sido chamados de “abelhudos” e “arapongas” e não de detetives. Felizmente o Superior Tribunal de Justiça não aceitou a sentença e, em troca, admitiu que o uso de expressões coloquiais ou populares não representa, “por si só”, uma ilicitude.


A decisão é digna de comemoração. Principalmente quando se sabe que, em uma terra como o Brasil, as palavras, principalmente populares, são desconsideradas. A imprensa, por exemplo, está cheia de anglicanismos. Abertura de matéria, por exemplo, se chama “lead” e o texto meramente informativo, “release”. Data limite é “deadline” e cercadura com texto em destaque, “box”. O mesmo ocorre no futebol.  Oriundo da Inglaterra, é natural que certas palavras, no início, fossem inglesas. Com o tempo, porém, se tornaram portuguesas. A luta para que voltem a ser inglesas é tão grande, no entanto, que muitos são os comentaristas que chamam a “reta final” de um campeonato de “playoff”. As outras palavras, “offside”, por exemplo, e “corner” viraram “impedimento” e “escanteio”. Mas como reagir ao grandprix (expressão francesa) das corridas de carro ou aos sets das partidas de tênis? Isso para não falar dos “games” ou “jogos eletrônicos” e do “time” que substitui, muitas vezes, o “tempo”.


As medidas tomadas pelos magistrados do Superior Tribunal de Justiça, portanto, fazem sentido. Mas a Fifa, pelo menos, não foi atingida por elas. “Arena”, no Brasil, sempre foi chamada de “estádio” e “pagode”, estilo musical. Dando o nome de “pagode” a uma tipografia, a Fifa entrou com um pedido no Instituto Nacional de Propriedade Industrial, Inpi, e registrou a palavra que, por isso mesmo, não pode ser usada por ninguém sem a sua autorização. Diz ela que pode. Desde que tal referência não tenha nenhuma relação com a Copa do Mundo no Brasil. Outra palavra ou expressão registrada por ela no Inpi foi “Brasil 2014” e “Mundial 2014”. As outras determinações da Fifa estão em seu Código de Conduta divulgado dia quatro de junho em seu site. Nele, os torcedores não podem usar garrafas ou copo (exceto de papel) nos estádios. Líquido de qualquer espécie, que não sejam comprados no local, ou comidas. Como se isso não bastasse, os torcedores também não terão direito de usar tablet ou laptop nem, muito menos, buzinas.


A preocupação com as manifestações públicas é tão grande que ninguém pode vestir camisa com indicações ideológicas ou cartazes. As bandeiras dos países, naturalmente, podem ser exibidas, mas terão que medir 2m x 1,5 e ter mastros flexíveis. Tudo isso em prol da boa conduta. Boa conduta esta que não foi adotada pela Federaçãoquando decidiu que o Hino da Copa, cantado por Jennifer Lopez, Cláudia Leite e o rapper PitBull, fosse composto em inglês e não em português, como seria mais adequado e educado. Tudo isso, diz ela, em sua defesa, acaba no final de 2014 quando, finalmente, a Lei Geral da Copa perde a validade. O que ela não explica é porque demorará tanto tempo para ter fim.

* Natalício Barroso é jornalista e escritor

 

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