No próximo dia 08 de outubro realizamos em Fortaleza mais uma edição da Marcha pela Vida contra o aborto. Sem dúvida um evento com uma mensagem forte que se alarga para além das individualidades de confissões religiosas e sociais. A defesa da vida sempre esteve em pauta nas mais variadas culturas e sociedades. Mas, neste caso específico, saindo do discurso genérico, adentra-se em um tema peculiar: a vida desde a concepção, desde o ventre materno.
Existem muitos defensores da prática do aborto, da morte da pessoa que está sendo gestada no ventre da sua mãe. A Marcha pela Vida, que tem edições em centenas de Cidades no mundo, quer ser um alerta principalmente na luta contra a aprovação de leis iníquas em diversas partes do mundo. Vale a pena lembrar o que falou Bento XVI sobre questões ligadas ao Estado, no ano 2010, a um grupo de Bispos brasileiros: “quando os direitos fundamentais da pessoa ou a salvação das almas o exigirem, os pastores têm o grave dever de emitir um juízo moral, mesmo em matérias políticas”.
Isso não vale apenas para os representantes da Igreja Católica, na verdade a exortação de Bento XVI é para todas as pessoas de boa vontade, que reconhecem o direito natural e inegável à vida. Longe das querelas políticas e tendo em conta a legítima e sadia separação entre Igreja e Estado, proclamada por Cristo quando declarou “‘dai a Cesar o que é de Cesar e a Deus o que é Deus’, não significa de maneira alguma que a moral oriunda da lei natural possa ser relativizada no campo político”. O Catecismo da Igreja Católica, no número 1903 afirma que “se acontecer de os dirigentes promulgarem leis injustas ou tomarem medidas contrárias à ordem moral, estas disposições não poderão obrigar as consciências”. E aqui emerge a situação da objeção de consciência, que profissionais leigos cristãos, ou mesmo não cristão, podem trazer em seu favor e das vítimas do aborto, as crianças e as mães.
Aqui vale lembrar que a luta contra o aborto é ao mesmo tempo a luta pela vida da mãe da criança; uma vez que as sequelas físicas e psicológicas marcam a vida da mulher com uma força tão grande que leva a traumas quase incuráveis. É bem isso o que diz o Papa Francisco na Carta a Dom Rino Fisichella por ocasião do Jubileu da Misericórdia:
“Um dos graves problemas do nosso tempo é certamente a alterada relação com a vida. Uma mentalidade muito difundida já fez perder a necessária sensibilidade pessoal e social pelo acolhimento de uma nova vida. O drama do aborto é vivido por alguns com uma consciência superficial, quase sem se dar conta do gravíssimo mal que um gesto semelhante comporta. Muitos outros, ao contrário, mesmo vivendo este momento como uma derrota, julgam que não têm outro caminho a percorrer. Penso, de maneira particular, em todas as mulheres que recorreram ao aborto. Conheço bem os condicionamentos que as levaram a tomar esta decisão. Sei que é um drama existencial e moral. Encontrei muitas mulheres que traziam no seu coração a cicatriz causada por esta escolha sofrida e dolorosa. O que aconteceu é profundamente injusto; contudo, só a sua verdadeira compreensão pode impedir que se perca a esperança”.
Neste ano de 2016 o tema da Marcha pela Vida em Fortaleza está exatamente em consonância com o pensamento do Papa Francisco: “Amamos a vida da mamãe e do bebê”. Como diz a professora Lenise Garcia: “o aborto não elimina a angústia da mãe, mas a perpetua para o restante da vida. por isso, depressão e pensamentos suicidas são mais frequentes em mulheres que já fizerem o aborto”. Por isso o cuidado paterno e materno que o Papa Francisco tem pedido na acolhida de tais mulheres.
Dirá ainda o Papa Francisco, na Exortação Evangelii Gaudium, n. 214: “E precisamente porque é uma questão que mexe com a coerência interna da nossa mensagem sobre o valor da pessoa humana, não se deve esperar que a Igreja altere a sua posição sobre esta questão. A propósito, quero ser completamente honesto. Este não é um assunto sujeito a supostas reformas ou ‘modernizações’. Não é opção progressista pretender resolver os problemas, eliminando uma vida humana”.
Deste modo, na Marcha pela Vida, colocamo-nos como Missionários da Misericórdia ao anunciar o valor incondicional da vida em todas as suas fases. Misericórdia que é tão propagada por muitas bocas, mas que na verdade é esquecida na hora de optar por uma vida que não merece ser tirada, porque é a mais indefesa possível. Infelizmente há muitos governos contrários à vida, que se fazem coniventes com todo o tipo de ação perversa e imoral. Ponhamo-nos a escuta da voz de profetas dos nossos tempos. Dizia Sta. Teresa de Calcutá: “Eis porque o aborto é um pecado tão grave. Não somente se mata a vida, mas nos colocamos mais alto do que Deus; os homens decidem quem deve viver e quem deve morrer”. E de São Francisco: “Senhor fazei de mim um instrumento de vossa paz”, paz que começa quando a vida é respeitada e defendida.
Padre Raphael Silva Maciel é reitor do Seminário Propedêutico de Fortaleza e missionário da Misericórdia.